Cerca de 300 lideranças indígenas do Mato Grosso do Sul se reuniram na terra indígena Nioaque (MS), região do Pantanal, para participarem da 4º Grande Assembleia do Povo Terena - Hánaiti Ho'Únevo Têrenoe. O encontro aconteceu na aldeia Brejão, entre os dias 13 e 16 de novembro. Este foi o primeiro encontro dos indígenas desde o assassinato de Oziel Terena pela Polícia Federal na tentativa de reintegração de posse terra indígena Buriti, em junho deste ano.
(Reportagem de Ruy Sposati - Cimi)
A assembleia criticou severamente a ineficácia do Estado em demarcar terras indígenas. Após a morte deOziel, foi criada pelo governo federal uma mesa de negociações entre indígenas, fazendeiros e governo estadual, na tentativa de encontrar soluções para a demarcação dos territórios. No entanto, após diversos prazos estipulados pelo próprio governo, "não há nada de concreto a ser apresentado aos povos indígenas do MS", afirma o documento final do Assembleia.
Jogo duplo
Os indígenas também denunciaram o jogo duplo dos fazendeiros nas mesas de discussão propostas pelo governo. "É público e notório a ameaça concreta intentada contra os povos indígenas pelos ruralistas deste estado", afirma a carta final, que denunciou a realização dos “leilões da resistência", anunciados pelos produtores rurais, "que tem por objetivo financiar milícias armadas", segundo os indígenas. Diversos casos de ataques, intimidações e ameaças que os Terena vem sofrendo foram relatados ao longo do encontro.
"Os mesmos ruralistas que sentam à mesa conosco estão articulando no congresso nacional e governo federal manobras para arrancar nossos direitos conquistados", pontuaram. Nesse sentido, os indígenas defenderam a revogação definitiva da Portaria 303, da Advocacia Geral da União (AGU), e posicionaram-se contra as rodadas de discussão com governo sobre a regulamentação da Convenção 169 da Organização Internacional de Trabalho (OIT). "Não discutiremos com o governo federal a regulamentação da Convenção 169 enquanto a Portaria 303 da AGU não for revogada", declararam os indígenas.
Leia a íntegra do documento final da 4º Assembleia Terena:
HÁNAITI HO’ÚNEVO TÊRENOE
GRANDE ASSEMBLEIA DO POVO TERENA
Conselho Terena
Aldeia Brejão
Terra Indígena Nioaque/MS -13 a 16 de novembro de 2013
O povo Terena se reúne pela primeira vez após a tragédia ocorrida em Buriti e presta sua homenagem ao guerreiroOziel Gabriel, vítima da omissão do Estado brasileiro e morto pela bala da polícia federal, a quem cabia a segurança de nossas comunidades.
Nós povo Terena, reunidos na Aldeia Brejão, Terra Indígena Nioaque, município de Nioaque, entre os dias 13 a 16 de novembro de 2013, juntamente com representantes do Povo Kinikinau, Povo Atikum e Povo Guarani Kaiowá e demais lideranças presentes, decidimos:
Política Geral
A tragédia está anunciada em Mato Grosso do Sul!
É público e notório a ameaça concreta intentada contra os povos indígenas pelos ruralistas deste estado. Repudiamos os chamados “leilões da resistência” anunciados pelos produtores rurais que tem por objetivo financiar milícias armadas. Denunciamos esse projeto criminoso que sempre existiu neste estado!
O governo federal instalou em Mato Grosso do Sul uma mesa de diálogo na tentativa de resolver a demarcação de nossos territórios. No entanto, após vários prazos estipulados pelo próprio ministro não há nada de concreto a ser apresentado aos Povos Indígenas de Mato Grosso do Sul. Os mesmos ruralistas que sentam à mesa conosco estão articulando no Congresso Nacional e Governo Federal manobras para arrancar nossos direitos conquistados.
Não iremos mais sentar à mesa enquanto não houver proposta concreta! Não negociaremos nossos direitos!
Exigimos a revogação da Portaria n. 303 da AGU! O Supremo Tribunal Federal já decidiu que as condicionantes impostas no julgamento de Raposa Serra do Sol não são vinculantes, portanto, não devem ser aplicadas em MS.
Não discutiremos com o governo federal a regulamentação da Convenção 169 da OIT enquanto a Portaria 303 da AGU não for revogada.
Repudiamos a atitude da bancada federal de Mato Grosso do Sul diante da indicação política para ocupar cargo do DSEI/MS, sem consultar as lideranças indígenas.
Território
A terra é nossa mãe, por isso não negociaremos. Repudiamos a mesa de diálogo imposto pelo governo federal! Exigimos que o Estado brasileiro cumpra a Constituição Federal e demarque os nossos territórios tradicionais.
A Terra Indígena Buriti pertence ao povo terena! Exigimos a demarcação definitiva e a resolução imediata do conflito fundiário.
Exigimos a pu portaria declaratória da Terra Indígena Taunay/Ipegue.
Repudiamos a manobra do estado de Mato Grosso do Sul que tem sistematicamente ingressado nas ações possessórias de demarcação, travando os processos no STF.
Exigimos a conclusão da demarcação da Terra Indígena Cachoeirinha e Limão Verde.
Exigimos conclusão dos estudos complementares da Terra Indígena Lalima e Pilad Rebuá.
Exigimos que a FUNAI inclua a Terra Indígena Nioaque no cronograma de prioridades e inicie o estudo de identificação e delimitação.
Educação
Assim como temos feito a respeito de nosso território, também retomaremos nossa educação própria, específica, diferenciada e multilíngüe. Nossas escolas não podem ser cabides de emprego. Nossas escolas, professores e alunos estarão juntos com nossas lideranças nas retomadas, pois acreditamos que sem nossos territórios não há que se falar em educação escolar indígena.
Nós iremos tomar frente das normas em nossas escolas. Não aceitaremos mais as imposições das secretarias municipais. Que as prefeituras municipais respeitem as decisões tomadas pelas lideranças quanto as lotação de professores e dos gestores da educação escolar indígena.
Queremos a eleição direta dos diretores da escola municipais e estaduais das escolas indígenas. Exigimos que concursos para professores indígenas sejam de fato diferenciado e especifico. Também exigimos que todas as medidas tomadas pelas lideranças no campo da educação escolar indígena sejam respeitadas pelos órgãos públicos.
Encaminhamentos
Exigimos que a FUNAI publique portaria constituindo grupo de trabalho para fins a identificação e delimitação da Terra Indígena Nioaque, Município de Nioaque, Mato Grosso do Sul;
Exigimos que a FUNAI publique portaria constituindo grupo de trabalho para fins a identificação e delimitação do território do Povo Kinikinau, Mato Grosso do Sul;
Exigimos que a Presidência da FUNAI publique portaria regulamentando emissão documentos administrativo para indígenas;
Exigimos que o Ministério Público Federal e o Ministério dos Direitos Humanos incluam nossas lideranças que estão na luta pela terra no programa de segurança de direitos humanos;
Exigimos que a SESAI preste atendimento de qualidade às comunidades que estão acampadas em área de litígio, em especial saneamento básico;
Foram escolhidos os membros para APIB;
Foram escolhidos os membros da Comissão da Juventude Terena;
Foram escolhidos os membros da Comissão das Mulheres Terena;
Foram escolhidos os membros da Comissão da Saúde indígena;
O conselho Terena se propõe a dialogar com a FUNAI, no sentido de apoiar o povo Kinikinau a lutarem por seu território;
O Conselho Terena indica Fernando de Souza para ocupar o Cargo de Coordenador do DSEI – MS.
O Conselho do Povo Terena em conjunto com o Conselho Aty Guasu indicou nome de liderança indígena para serem lançados ao pleito de deputado estadual e federal em 2014;
Fica encaminhado para criação do conselho da assembléia Terena, nos dias 08 a 10 de dezembro em Campo Grande – MS.
Fica encaminhando que o III Encontro da Juventude Terena (Hánaiti Ho’únevo Inámati Xanéhiko Têrenoe) será realizado na Comunidade Esperança em setembro de 2014;
Fica encaminhado que o I Encontro das Mulheres Terena (Hánaiti Ho’únevo Senóhiko Têrenoe) será realizado na Comunidade Esperança nos dias 28 e 29 de novembro de 2013.
Fica encaminhado que a 5º Assembleia do Povo Terena (Hánaiti Ho’únevo Têrenoe) será realizada na Aldeia Babaçu, Terra Indígena Cachoeirinha, em maio de 2014.