COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Roberto Malvezzi, conhecido como Gogó, explica, neste artigo, que a técnica de dessalinização da água, prometida pelo novo governo federal, é algo já presente no Semiárido brasileiro.  “Os técnicos e cientistas da Embrapa Semiárido e universidades nordestinas há décadas fazem intercâmbio com Israel. Portanto, não é novidade”. Confira:

 

(Por Roberto Malvezzi – Gogó* | Imagem: João Zinclar)

A técnica de dessalinização em pequenas unidades está espalhada pelo Semiárido brasileiro. Marina Silva, quando ministra do Meio Ambiente do governo Lula, criou o programa “Água Doce”, exatamente utilizando essa técnica.

A dessalinização é complicada porque gera de 40% a 60% de rejeitos altamente salinizados que é de difícil descarte. Uma das possiblidades utilizadas pelos técnicos brasileiros foi o reaproveitamento como alimento de plantas e animais. Em muitos lugares a técnica funciona.

O que mudou o Semiárido Brasileiro nos últimos anos foi a captação da água de chuva em cisternas para beber e produzir. O Programa Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2) replicaram mais de 1 milhão de vezes tecnologias apropriadas para essa finalidade, principalmente as cisternas de placas. Basta fazer um gráfico da implantação dessas políticas públicas, comparando-as com a elevação do IDH da região que a tendência de alta coincide com exatidão. Claro, junto vieram as políticas de energia, telefonia, internet, outras adutoras, elevação do salário mínimo, Minha Casa Minha Vida e o Bolsa Família. Aqui reside a política que nenhum governo anterior jamais fez.

O presidente eleito desse país diz que vai trazer a técnica de dessalinização em um programa conjunto com Israel. Os técnicos e cientistas da Embrapa Semiárido e universidades nordestinas há décadas fazem intercâmbio com Israel. Portanto, não é novidade.

Além do mais, o Semiárido Brasileiro tem 1 milhão de Km², enquanto Israel tem pouco mais de 20 mil km², portanto, cabem 50 Israel dentro de nosso Semiárido. Para completar, nosso Semiárido é o mais chuvoso do planeta com uma precipitação anual em torno de 700 mm, enquanto Israel mal chega a 100 mm anualmente. Por isso, nas últimas décadas foi desenvolvido o paradigma da “Convivência com o Semiárido”, inspirado em Celso Furtado no seu discurso inaugural da Sudene em 1959, mas tirado do papel e ganhado carne com iniciativas da sociedade civil.

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Junto com a captação da água de chuva a sociedade civil nordestina defendeu a distribuição da água acumulada por adutoras simples. Prevaleceu a grande obra da Transposição, que tem problema sérios de operacionalização, impacto no Rio São Francisco, mas que aumentou a oferta de água na Paraíba.

Há décadas sabemos que a seca é um fenômeno natural, assim como o gelo nas regiões frias. Não se combate a seca, mas se convive com o ambiente que é semiárido. Só os ultrapassados em conhecimento e em história ainda falam em combater a seca.

O Brasil já tem o conhecimento e as técnicas para resolver todos os problemas do Semiárido. Bastaria continuar implantando os programas de Convivência com o Semiárido e, se necessário, criar outros. Portanto, é uma questão política. Mas parece ser mais fácil dessalinizar toda água do mar que certos cérebros que estão no comando desse país.

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*Atua na Comissão Pastoral da Terra (CPT) e no Conselho Pastoral dos Pescadores na região do São Francisco. Articulista do Portal EcoDebate, e possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. E é membro da equipe de assessoria da REPAM (Rede Eclesial Pan Amazônia). 

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