COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

“Nossos líderes não são mortos, mas plantados, e nós somos os frutos, continuando a luta”, afirmou uma das lideranças indígenas presente no “Encontro de Articulação das Pastorais e Povos do Campo”, realizado na semana passada no Centro de Formação Vicente Cañas, em Luziânia (GO).

 

(texto Egon Heck e fotos Laila – CIMI – Secretariado Nacional)

Vários depoimentos de outras lideranças expressaram os mesmos sentimentos. “Estamos rodeados de jagunços... vivemos ameaçados... a qualquer momento podemos ser mortos”.

Num momento de profunda crise e incertezas, foi muito importante refletir e traçar estratégias de luta para evitar retrocessos nos direitos das comunidades e povos tradicionais, como os povos indígenas, quilombolas, pescadores, migrantes, dentre outros.

Ao analisar a conjuntura, a partir de cada segmento social e do conjunto das populações no campo, percebeu-se a importância de uma manifestação conjunta. No documento foram expressos os temores e compromissos dos membros das Pastorais do Campo e representantes dos povos e comunidades que vivem e lutam na terra e pela terra.  “não podemos permitir que as conquistas democráticas e que os direitos civis, políticos e sociais sejam mais uma vez afrontados pela força da intolerância, do conservadorismo e da violência, física e/ou institucional... gerando um clima de instabilidade, violência e medo”. (Carta Aberta e Defesa da Democracia Brasileira). [Acesse aqui na íntegra]

Apesar das apreensões que vinham das ruas e dos corações de milhões de brasileiros, os trabalhos fluíram com a serenidade e indignação necessárias, para fazer avançar a construção de um novo projeto para o país, onde sejam respeitadas e valorizadas as diversidades culturais, as sabedorias seculares, as formas de viver e conviver com a natureza e todas as formas de vida, com justiça social e dignidade.

Nesta caminhada são fundamentais os processos formativos de militantes e lutadores, animados e impulsionados por uma espiritualidade e mística que ajude a enfrentar os interesses e poderes responsáveis por tanto sofrimento e violência.  Os povos e comunidades tradicionais têm sido permanentemente espoliados de seus direitos de viver na e da terra, em paz e harmonia. Foram e continuam sendo pressionados e expulsos da terra pelo avanço do agronegócio e dos grandes projetos de mineração, hidrelétricas rodovias, hidrovias e outros tantos projetos do grande capital.

Xô Matopiba

Um dos temas analisados foi o ameaçador Plano de Desenvolvimento Matopiba o qual se insere na lógica desenvolvimentista e que põe em risco o que resta do bioma Cerrado, pois é o carro chefe da política do agronegócio implementado pela atual ministra da Agricultura, Kátia Abreu. É considerada a última fronteira agrícola do país.  É neste bioma em que vivem mais de 20 milhões de pessoas, sendo uma das regiões de proporcionalmente maior população vivendo no interior. Portanto toda essa população, e com maior intensidade as populações tradicionais, povos indígenas, quilombolas, pescadores, camponeses e todos os que vivem da terra estarão fatalmente impactados e sua sobrevivência no cerrado, ameaçada.

Estudos mostram que “se toda essa devastação continuar no Cerrado terá fim o bioma e as principais fontes de água do Brasil e da América do Sul” (Manifesto dos Povos do Cerrado no Dia Mundial da Água).  No mesmo documento os povos do cerrado exigem o “reconhecimento do Cerrado como Patrimônio Nacional, com aprovação da Lei 504/2010... é importante que o governo federal garanta a demarcação dos Territórios Indígenas, regularização e titulação das terras dos Quilombolas, Geraizeiros, Retireiros, Ribeirinhos, Pescadores, Vazanteiros e o assentamento dos Sem Terra”.

O grito das águas

Recentemente ouvi o clamor dramático de aldeias indígenas passando sede ou sendo obrigados a ingerir águas contaminadas pelas monoculturas do agronegócio. É cruel assistirmos cenas de sede num dos países de maior volume de água doce do planeta. O que parecia inimaginável até pouco tempo, já estamos presenciando.

“O Cerrado, berço das águas, não só está ameaçado, como tem sido assassinado dia após dia. E se ele for extinto levará consigo a água que chega às torneiras, usada para beber, banhar, cozinhar, molhar as plantações, dar de beber aos animais...”. O manifesto dos Povos do Cerrado propõe que “a proteção das águas tinha que ser questão de segurança nacional, por que se o Cerrado for extinto, leva ao fim dos rios e dos reservatórios de água” (Altair Sales).

Tempos de mobilizar a esperança, articular sonhos, ampliar a união e alianças, indignar-se invocar nossos mártires e guerreiros para a grande luta pela Vida.

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