Quando as chuvas são abundantes após anos de seca, como no início deste ano 2016, diante de um rio transbordando ou de uma cachoeira borbulhando, com os olhos que se enchem de alegria, muitos dizem, apontando para o céu: “Tá vendo? Deus no comando!”. Perguntamos ao nosso companheiro da CPT, Roberto Malvezzi – Gogó, como você interpreta esse “Deus no comando”? Abrindo um sorrisinho inicialmente tímido, ele nos respondeu assim.
(Fonte: CPT Bahia/Por Roberto Malvezzi – Gogó)
Talvez levemos ainda algumas décadas para termos uma visão mais completa e respeitosa do ciclo das águas brasileiras.
Na escola aprendíamos um ciclo esquemático, das águas que evaporam nos oceanos, são empurradas em forma de vapor para os continentes, que caem na forma líquida ou sólida, cuja parte penetrará no chão e formará os aquíferos, outra evaporará, outra escorrerá para os oceanos ou outros corpos d’água de superfície. Mas, como é que o ciclo se faz realmente de lugar para lugar?
Quando não tínhamos a ciência tudo era explicado de forma religiosa, nas mais variadas formas das mais variadas religiões. Havia ali uma intuição, uma sabedoria, mas não a explicação objetiva da ciência.
As chuvas que caíram sobre o Semiárido Brasileiro, particularmente no mês desse janeiro último (2016), mais uma vez foram atribuídas a Deus por nossa gente. Afinal, vínhamos de uma longa seca, chovendo cada vez menos há vários anos. Nossos reservatórios estavam secos, principalmente pequenos e médios, sobrando pouca água nos grandes reservatórios.
Quando a situação assim se apresenta, não há como repor as águas a não ser pelo ciclo das chuvas. Portanto, a primeira arrogância a ser destronada é que não podemos depender do ciclo das chuvas. Todas as reposições dependem dele. Se não houver as chuvas, qualquer região do mundo se transforma em deserto, a não ser algumas margens de rios que se originam onde chove.
Esse é o problema mais grave do ciclo das águas brasileiras. Alguns cientistas como Antônio Nobre do INPE, Prof. Altair Sales da PUC/Goiânia e José Alves da UNIVASF, apresentam elementos fortes que estamos “arrebentando” com o ciclo milenar de nossas águas.
Como? Destruindo a floresta amazônica, na qual se origina grande parte do vapor de águas que vai cair em grande parte do território nacional e até na Patagônia. Elas viajam em forma de vapor d’água, como verdadeiros rios voadores, e vão cair longe de seu lugar de origem. Portanto, destruindo a Amazônia, estaremos destruindo a origem de grande parte de nossas águas.
Segundo, o desmatamento do Cerrado, nossa caixa d’água, que armazenava as águas vindas da Amazônia e depois as distribuía para as várias bacias brasileiras com origem no Cerrado. Todos os rios oriundos do Cerrado estão minguando. Um deles é o Rio São Francisco.
Assim, não estamos apenas saindo de um novo ciclo de seca, normal, principalmente na região Semiárida. Nossa dúvida é o que vai restar do ciclo de nossas águas e qual o impacto que essas mudanças terão sobre todo o ambiente, inclusive o humano.
Por isso, mais que nunca a pertinência de nossas lutas em defesa da Floresta Amazônica, do Cerrado, da Caatinga, de todos os biomas. Sem árvores não há água.
Também, continuemos nosso esforço pela cultura da “gota d’água”, aproveitando e reutilizando-a minuciosamente, com todo cuidado de uma fêmea sobre suas crias. Sem uma nova cultura da água não teremos um futuro úmido.