Com o lema “A pesar da seca e das cercas, o Cerrado ainda floresce”, a 12º Festa da Troca de Sementes Crioulas aconteceu no último dia 19, na Comunidade Minhocal, no município de Jangada, no Mato Grosso.
(Por Andrés Pasquis, Gias)
A Festa da Troca de Sementes Crioulas começou doze anos atrás, organizada pela Comissão Pastoral da Terra – CPT em parceria com outras organizações e comunidades da Baixada Cuiabana. “A festa começou pequenina, que nem uma semente que brotou, cresceu e hoje já é bem conhecida”, lembrou a Irmã Vera, coordenadora estadual da CPT. Foi assim que no último sábado (19) a comunidade de Minhocal, em Jangada, celebrou a XII Festa da Troca de Sementes Crioulas, com o lema “A pesar da seca e das cercas, o Cerrado ainda floresce”.
A coordenadora explicou o lema: a pesar dos ataques do sistema imposto pelo agronegócio, as comunidades tradicionais e a agroecologia continuam florescendo. Sendo assim, a Festa foi criada com o objetivo de preservar a cultura, a tradição e a vida através da difusão de conhecimentos e das sementes crioulas. “É uma luta contra esse sistema, que quer transformar o Mato Grosso no celeiro do agronegócio. Vamos mostrar que nosso estado é muito mais do que isso, sendo conhecido pela agricultura familiar, pela agroecologia e por suas sementes crioulas”, declarou Vera. No entanto, a Irmã advertiu que para que isso seja possível é imprescindível juntar os conhecimentos tradicionais com os conhecimentos acadêmicos.
Nesse sentido, o professor do campo Rubens Land explicou que é necessário fortalecer cada vez mais a escola do campo, conscientizando a juventude com a noção de que agroecologia é vida. Um dos alunos de Rubens, Maiço Mialho, explicou que o campo é esquecido pela cidade. “A educação do campo é desprezada, mas a cidade esquece que sem o campo não vive. É essa educação que nos ensina a trabalhar e viver de um jeito que seja social e ambientalmente correto, como costumavam fazer nossos antepassados”, explicou o estudante.
Por outro lado, Cristiano Apolucena, coordenador estadual da CPT, falou da importância de proteger o bioma mais antigo de Sul-américa também conhecido por ser a caixa d’água do continente, o Cerrado. “O Cerrado é ameaçado pelo agronegócio que, como seu nome indica, trata terra, água e pessoas unicamente como lucro e negócio. Com essa ótica, esse sistema destrói o meio ambiente, envenena a população e explora os trabalhadores. A alternativa sem veneno, destruição ou injustiça é a agroecologia”, disse Cristiano.
Na sequência o documentário “O veneno está na mesa”, de Silvio Tendler, foi apresentado. O vídeo, baseado no estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco, denuncia os riscos inerentes à plantação de transgênicos e ao consumo de agrotóxicos. O Brasil é o maior plantador de transgênicos do mundo, além de pôr no prato de cada brasileiro o mais de 7 litros de agrotóxicos por ano. Nesse sentido, Francileia Paula de Castro, técnica da Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educional – Fase e representante estadual da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, declarou que essas práticas, perigosas e nocivas, não são agricultura. A técnica explica que A agricultura verdadeira vai muito além do cultivo orgânico, ela implica o respeito do meio ambiente, o cuidado com o outro e o saber viver em comunidade com educação, orientação da juventude e abordando as questões de gênero. “Por isso, momentos importantíssimos como a festa da semente nos ajudam a resgatar tradição e cultura, ganhando consciência para resistir ao agronegócio”, disse Francileia.
Depois das palestras e debates, os visitantes puderam participar de cinco oficinas realizadas na escola da comunidade: Agroecologia e Sementes Crioulas, Saúde e Plantas Medicinais do Cerrado, Frutos do Cerrado, Brincando e Reciclando e a oficina de Cuidado da Água e da Vida. A Festa também foi o palco da do grupo de Siriri dos alunos da Escola Municipal do Campo de Educação Básica Severiano Vieira da Silva, ao som da viola de coucho e do mocho. A comunidade do Minhocal ofereceu um almoço tradicional com costela e banana e vários produtos agroecológicos estavam à venda, como licor e castanha de cumbaru ou bolo de arroz.
Finalmente, o momento mais esperado do dia chegou com a troca de mudas e sementes. A Festa, que acolheu cerca de 300 pessoas vindas de várias comunidades, foi o cenário de um intercâmbio de inúmeras sementes e mudas crioulas, abraços e sorrisos, na alegria e no bom humor que tinha começado com a canção “Eu creio na semente, lançada na terra, na vida da gente. Eu creio no amor”, do Padre Osmar.
Os participantes já decidiram a data da próxima Festa da Troca de Sementes Crioulas para o sábado 22 de outubro de2016, na comunidade de Raizama, enquanto as palavras da Irmã Vera são lembradas por todos: “Vamos continuar resistindo e lutando contra esse sistema, sem perder a esperança”.