Delegação brasileira apresentou o panorama nacional sobre o desmatamento do ecossistema para plantio de soja no Congreso de los Diputados.
Por Pedro Mox
O Brasil foi pauta do dia mais uma vez no congresso espanhol. Dessa vez o desmatamento no Cerrado, uma das consequências da agroindústria produtora de soja, em sessão da Comissão de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. O tema foi apresentado pelas vozes de Valéria Pereira Santos, da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e integrante da Coordenação Executiva da Campanha Nacional em Defesa do Cerrado; e André Campos, jornalista da Repórter Brasil.
Por cerca de uma hora Valéria e André falaram aos deputados espanhóis em um dia agitado pelo depoimento da diretora do Centro Nacional de Inteligência (CNI) sobre a espionagem realizada a pessoas ligadas ao indepedentismo catalão. A denúncia, publicada pela revista The New Yorker – chamadas “catalangate” – caíram como uma bomba no país, dificultando ainda mais a já delicada geometria parlamentária espanhola. Mas isso merece um texto à parte, voltemos à Terra Brasilis.
O panorama apresentado, tristemente, não pinta nada bem – como qualquer coisa no país desde 18. Há uma grande preocupação da União Europeia para que as importações tenham um “selo verde”. A soja brasileira aqui tem dois usos principais: alimentação de gado e fabricação de biocombustíveis. A troca do azeite de palma pelo de soja gera um enorme interesse no grão vindo dos trópicos, o que desencadeia mais e mais desmatamento e grilagens. Por tabela, áreas utilizadas para pecuária são também empurradas, expandindo sobre outros ecossistemas.
Valéria conversa com o vice-presidente primeiro da comissão, José Losada Fernández, e as deputadas Lucía Muñoz Dalda e Maria Carvalho Dantas.
Diversos países visam deixar de utilizar soja e palma a curto prazo. França, Portugal ou Alemanha, por exemplo, até o ano que vem no máximo. Já a Espanha aparentemente utilizará toda margem oferecida pela UE, 2030.
"O Agro é pop, é tech, é tudo", diz o slogan da televisão. É também invasões, conflitos e morte. A Pastoral da Terra aponta que 109 pessoas perderam a vida em decorrência de conflitos no ano passado, e em 2020, 40% dos conflitos aconteceram no Cerrado e área de transição. Copio e colo, literalmente, o que diz o informe sobre massacres no campo da CPT:
Atualmente, destaca-se a nova crescente de massacres dos últimos 20 anos, que se inicia em 2017 e se mantém com registros anuais de novos episódios de violência. Esse “novo boom” reflete um período no qual a conjuntura política e a consolidação da extrema direita nas estruturas legislativas e executivas beneficiaram diretamente o avanço do agronegócio, garimpo, desmatamento e queimadas. Neste período, 50 pessoas foram vitimadas fatalmente, em 9 massacres.
MATOPIBA
A sigla une os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia para além das letras: é umas das regiões mais desmatadas para plantação de soja. Em um modelo de produção nada sustentável, a produção de soja engloba o uso de água, esgotamento da terra e as vidas dos que lutam em sua defesa. É necessário mais do que um papel; ponto no qual André foi assertivo: não confiem em nada que venha do Brasil. Da mesma forma que árvores centenárias de mata nativa tornam-se legais em uma assinatura, dois carimbos e um folha de papel carbono, a soja recebe igual tratamento.
O desmatamento no atual governo aumentou quase 80% em áreas protegidas. Na Amazônia, incremento de 57%. São recordes sobre recordes. Mais da metade em terras públicas e quase todas federais. Nas terras indígenas crescimento de 150%. Da soja entregue à Europa, 2/3 sai da Amazônia ou do Cerrado. Esse, porém, não dispõe da mesma proteção daquele. E sem proteger o Cerrado, como salientou Valéria, é impossível proteger a floresta amazônica.
A la vez, territórios indígenas e quilombolas, onde a natureza é melhor preservada, são alvo de invasões senão acobertadas pelo governo federal, ao menos ignoradas para ser delicado. É necessário e urgente que Cerrado e Pantanal sejam incluídos no acordo da União Europeia com o Mercosul. Garantir a sua demarcação e proteção é defender o meio-ambiente e atuar concretamente contra o aquecimento global – algo que os governos do velho mundo precisam ter muito claro. Defender a Amazônia é defender o Cerrado e o Pantanal.