COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Representantes das Pastorais do Campo do Nordeste (Cimi, CPP, CPT, PJR, SPM e Cáritas) se reuniram, nos dias 25 e 26 de maio, no Recanto do Pescador, em Olinda, Pernambuco. Confira a Carta do Encontro:

 

“Quero uma Igreja solidária,

servidora e missionária,

que anuncia e saiba ouvir./

Ao lutar por dignidade,

 por justiça e igualdade,

pois eu vim para servir.

(cf. Mt 10, 45)

 

Representantes das Pastorais do Campo do Nordeste (Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP, Comissão Pastoral da Terra – CPT, Pastoral da Juventude Rural – PJR, Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM e Cáritas) encontraram-se fraternalmente nos dias 25 e 26 de maio 2015, no Recanto do Pescador, em Olinda-PE, espaço de formação popular e articulação das lutas dos pescadores e pescadoras, que o CPP colocou à disposição. Além do encontro de amigos (as) e companheiros (as) ser sempre enriquecedor, o intuito principal foi aprofundarmos o momento conjuntural de nossa realidade, cujos dias, meses e anos, “fazem pensar”. Nosso horizonte é cotidianamente povoado pelas tribulações e esperanças dos povos indígenas e quilombolas, camponeses com suas múltiplas facetas, comunidades tradicionais pesqueiras, homens e mulheres da migração forçada, juventudes rurais, do meio popular e das periferias urbanas.

Compartilhamos nossas experiências, metodologias e desafios. Recobramos de nós mesmos vontade firme para renovarmos nossa opção: assumir, junto com os protagonistas, ao redor das terras, territórios e águas de nosso Nordeste, perspectivas conjuntas de colaboração e atuação mais eficazes. Apesar de vivermos uma realidade que se apresenta, cada vez mais, “diversa e adversa”, fomos unânimes em assumir que uma das dimensões que configura nosso ser e nos caracteriza chama-se: “pastoralidade”, com as ressonâncias bíblicas e históricas que esta palavra evoca.

Nosso filtro de leitura, portanto, nos apontou algumas focalizações que, sinteticamente aqui elencamos como atitudes e opções de “trabalho pastoral”:

- Repudiamos a violência e expulsão de povos e comunidades tradicionais e camponeses de suas terras e territórios. Nestes últimos anos, de forma mais acelerada, uniram-se aos interesses vorazes do capital o Estado nos três níveis, federal, estadual e municipal. Capital e Estado, portanto, são promotores da expropriação e violência a serviço de seus interesses economicistas;

- Condenamos a privatização e mercantilização da natureza, de suas dádivas básicas e comuns como a terra, água e a biodiversidade;

- Denunciamos, com a veemência que nos vem da ética que cultivamos e de nossa história, a forma premeditada e perversa com que Executivo, Congresso e Judiciário, têm violado e produzido retrocessos em direitos adquiridos, conquistados e consolidados pelas lutas dos povos ao longo de nossa história, que tiveram uma etapa positiva na Constituição Federal de 1988;

- Jamais aceitaremos e deixaremos de denunciar o extermínio das juventudes, em especial a negra e empobrecida. Este crime instalado no Brasil inteiro é promovido com uma violência institucionalizada, que nos envergonha como humanos;

- Completa o nosso grito o repúdio ao preconceito e à falta de incentivo para com as juventudes rurais e das periferias e todas as formas de violência contra as mulheres.

Como cristãos e cristãs, no horizonte ecumênico, aberto e acolhedor para todas as denominações eclesiais e religiosas, no sentimos enraizados nesta dimensão, chamada pastoralidade, desde o Concílio Ecumênico Vaticano II, concluído em 1965. Nestes 50 anos, o Espirito Santo de Deus aponta para que as Igrejas sejam cada vez mais, sobretudo no nosso Nordeste do Brasil, populares, encarnadas nas experiências múltiplas das CEBs, vivendo espiritualidades e teologias libertadoras, a própria missão que Jesus assumiu e as primeiras comunidades assumiram (cf. Lc 4,18 e At 3,1-9).

Partilhamos assim os apelos do Espírito para:

- Retomar o trabalho de base e nas bases das Igrejas e da sociedade;

- Reorganizar pequenos grupos, núcleos, comunidades, conselhos locais que sintam a força do Espírito de Deus para agir de modo autônomo e interconectado;

- Incentivar o hábito de rodízio periódico de cargos e tarefas ligadas aos ministérios de coordenação, como método “revolucionário e alternativo ao sistema” de renovação e radicalização da democracia. Estas palavras, para nós, são sempre uma exigência explícita e inseparável do chamado à comunhão;

- Favorecer a autogestão e auto sustentabilidade como exercício da autonomia e soberania dos povos, comunidades e movimentos.

Sentimos, nessa busca, o sopro do Espírito também quando nos impele a reavivar o nosso compromisso com a radicalização da democracia. Daí a importância também de promover mobilizações populares como forma de expressar a indignação diante do atual modelo hegemônico de desenvolvimento: violento, concentrador e excludente. Assumimos o compromisso de participação efetiva nos rumos do País, reconhecendo que, historicamente, os direitos garantidos que temos só foram possíveis pela organização e mobilização de toda sociedade.

Afirmamos a importância das mais diversas experiências locais para que sejam adequadas ao modo de vida dos nossos povos, à produção nos diferentes ecossistemas e biomas; a partir de perspectivas de convivência e sustentabilidade, em vista da vida com dignidade das atuais e futuras gerações. Sentimos como urgente aprofundar e apontar caminhos para um novo modo de produção, um novo modo de consumo e gestão da sociedade.

Neste quadro convocatório, sentimo-nos encorajados para fazer memória e reafirmarmos, como enraizados num sulco fecundo, os encaminhamentos do Encontro Nordeste da 5ª Semana Social (4-6 de abril de 2014). Com força crítica e aceitando a riqueza da diversidade, este momento unificou a inspiração do Espírito de Javé e a lucidez do discernimento humano diante dos desafios do hoje. A articulação de movimentos e pastorais populares, do campo e urbanos, continua nos apontando uma outra perspectiva para o Nordeste, a partir do próprio povo.

Nesta hora, tribulada e esperançosa, sopra também, em nossas vidas, o Espírito com que os posicionamentos de papa Francisco confirmam nossa fé e nossa ousadia evangélica. Fé e ousadia poderão proporcionar eficáciaao sopro unificador da vida dos povos indígenas, quilombolas, camponeses e camponesas, ribeirinhos e ribeirinhas, pescadores e pescadoras. E através deles a toda a humanidade e ao nosso “planeta doente”.

Este sopro vem dar novo vigor à rica tradição cultural de fé, esperança e solidariedade amorosa da Terra sem Males, do Bem Viver e do Axé que a riqueza de nossas tradições históricas e culturais populares nos deixaram em preciosa herança e que nós assumimos ao gritarmos com lúcida vibração: Amém, Axé, Awêre, Aleluia!

 

OS/AS REPRESENTANTES DAS PASTORAIS DO CAMPO

DO NORDESTE DO BRASIL

Olinda – PE, 25-26 de maio de 2015

 

 

 

 

 

 

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