Da Rádio e TV Quilombo
Imagens registradas pela comunidade
As investidas de latifundiários-grileiros para roubar as terras quilombolas no Maranhão são cada vez mais violentas. O Maranhão continua a figurar como um dos estados que possui o maior número de conflitos agrários em territórios de comunidades tradicionais, muitos deles resultantes em assassinatos de suas lideranças, de acordo com os relatórios da CPT – Comissão Pastoral da Terra.
No território Cancelas, localizado no município de São Benedito do Rio Preto – MA, a realidade não é diferente. A comunidade tem sido atacada recorrentemente e das mais variadas formas por grileiros. Há duas semanas, o povoado teve suas terras invadidas por 14 tratores com correntões que desmataram grande extensão de mata. Na ocasião, cerca de 70 mulheres e homens se puseram à frente das máquinas e enfrentaram os tratoristas, expulsando-os de dentro do território.
Como forma de revide, os grileiros atearam fogo na região provocando grande destruição ambiental nos locais onde os moradores utilizam para fazer seus roçados, caça e coleta de alimentos. O incêndio atingiu mais de mil hectares de mata, segundo as informações dos moradores.
Este conflito já dura alguns anos e mesmo com todas as comprovações legais de ser uma área quilombola que abriga centenas de família, o Poder Judiciário do Maranhão deferiu medida liminar a favor do fazendeiro para impedir as famílias de acessarem suas roças e fazer a coleta de coco babaçu, empurrando homens, mulheres, crianças e idosos para uma situação de fome e desalento, cenário amenizado pela solidariedade de outras comunidades e movimentos sociais que arrecadaram e doaram alimentos para as famílias. O processo judicial é acompanhado pela Defensoria Pública do Maranhão.
O episódio em Cancelas não é um ato isolado, as queimadas tem sido uma estratégia de grilagem de terra em todo o país. Na mesma semana do ato criminoso, a plataforma Monitor do Fogo, do site MapBiomas, apresentou os dados das queimadas do ano de 2024. O documento aponta o estado do Maranhão como um dos que mais houve queimadas na região amazônica.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Felipe Martenexen, da equipe do MapBiomas, enfatizou que “o fogo na Amazônia não é um fenômeno natural e não faz parte de sua dinâmica ecológica, sendo um elemento introduzido por ações humanas.”
Não sendo nenhuma surpresa, o município maranhense onde houve maior registro de focos de incêndio foi Balsas, no sul do estado, celeiro da soja e do milho, culturas introduzidas pelos conhecidos “gaúchos”, num violento processo de desmatamento, expulsão dos posseiros e das comunidades tradicionais, reafirmando que o latifúndio e o agronegócio como frutos da grilagem são os principais responsáveis pelos conflitos ambientais e agrários que afetam as comunidades maranhenses.
Não há dúvidas de que a política agrária do estado do Maranhão facilita e prioriza o latifúndio e a monocultura da soja e do eucalipto, além da pecuária extensiva desde muito tempo. Ironicamente, o Ministro da Suprema Corte Judicial Brasileira, Flávio Dino, ex-governador do estado do Maranhão, estabeleceu, na última semana, prazo para que as unidades federativas que compõem os biomas Amazônia e Pantanal apresentassem os seus planos de combate aos incêndios. No entanto, o Ministro, enquanto governador, entregou as terras maranhenses nas mãos dos latifundiários, principais envolvidos nas queimadas criminosas, tendo como principal facilitador, seu vice na época, Carlos Brandão, que é hoje o atual governador e responsável pela nova lei de terras que facilita a grilagem para entregar o restante das terras públicas aos latifundiários.
Vale lembrar que neste mesmo município, São Benedito do Rio Preto, fica a comunidade Baixão dos Rochas, que enfrentou um despejo ilegal em 2023. À época, a comunidade foi invadia no período da noite, destruíram suas plantações, as residências, casas de farinhas, mataram os animais, roubaram os alimentos, além das torturas físicas e psicológicas aos moradores que até hoje sofrem as consequências. Após o episódio, o Governo do Maranhão “pacificou” a área, regularizando cerca de apenas 30% do território para a Associação do Baixão dos Rochas, deixando o restante livre para empresas do latifúndio continuarem degradando a região com o plantio de soja.
O Governo de plantão já deixou claro de qual lado está nesta guerra. Estar com os latifundiários e grileiros!
No entanto, denunciamos publicamente aos órgãos responsáveis legalmente em investigar e punir esses crimes ocorridos no dia 23/01/2025, principalmente a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, SEDIHPOP, Delegacia Agrária, ITERMA, o Ministério Público e o Poder Judiciário. Exigimos na maior brevidade possível a regularização do Território Cancelas em nome da Associação dos moradores Quilombolas de Cancelas, sob sério risco de o conflito ganhar dimensão ainda mais graves.
- Centro de Defesa dos Direitos do Povo Pe. Cláudio Bergamaschi
- Fóruns e Redes de Cidadania do Estado do Maranhão