COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Do site do frei Gilvander Moreira - CPT/MG

VII Colóquio Internacional Povos e Comunidades Tradicionais na Comunidade Quilombola da Lapinha, em Matias Cardoso, no norte de MG. Foto reprodução CAA.NM

No dia 11 de setembro de 2024, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, sancionou o Decreto Nº 48.893/2024, que ataca diretamente os direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais. O decreto viola o direito à Consulta Livre, Prévia e Informada, garantido pela Convenção 169 da OIT, e favorece grandes projetos de destruição nos territórios tradicionais.

Este ato desconsidera a voz de milhares de comunidades e favorece interesses econômicos que colocam em risco a biodiversidade e a vida das pessoas. A história e a cultura dos Povos Tradicionais não podem ser tratadas com tamanho descaso. É urgente a revogação deste decreto! Vamos lutar por justiça e pela preservação da nossa terra e de quem nela vive!

Acesse a carta em: https://gilvander.org.br/site/wp-content/uploads/2024/09/CARTA-DE-REPUDIO-AO-DECRETO-No-48.pdf


CARTA DE REPÚDIO AO DECRETO Nº 48.893/2024 E EM DEFESA DOS DIREITOS DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DO ESTADO DE MINAS GERAIS

Belo Horizonte, 15 de setembro de 2024.

Em meio à seca histórica e às fumaças que cobrem os céus do Brasil, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, em mais um ato perverso de ataque aos direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais e da Natureza, publicou, no dia 11 de setembro de 2024, o Decreto nº 48.893/2024, que viola o direito dos Povos e Comunidades Tradicionais à Consulta Livre, Prévia, Informada e de Boa-fé, e, favorece o avanço dos grandes projetos do capital que causam morte e devastação nos territórios tradicionais e compromete as condições de vida de toda a sociedade e da biodiversidade. O Decreto em si já é uma aberração jurídica, uma vez que a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) não precisa de regulamentação para ser plenamente aplicada. Um Decreto semelhante a este editado pelo Governador do Pará já foi anulado.

Desde 2003, quando entrou em vigor no Brasil o Tratado Internacional da Convenção 169 da OIT, suas disposições são obrigatórias e nenhum órgão governamental pode descumpri-la ou limitar os direitos nela abarcados. Além disso, não houve nenhuma participação ou consulta às Comunidades, violando o artigo 6° da mencionada Convenção. O teor deste decreto é praticamente o mesmo da Resolução Conjunta SEDESE/SEMAD Nº 1, de 4 de abril de 2022, que foi revogada, após muita pressão dos Movimentos Sociais, Povos e Comunidades Tradicionais. Este Decreto eivado de ilegalidades e de inconstitucionalidades busca amordaçar e aniquilar os direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais protegidos pela Convenção 169 da OIT.

Destacamos outros pontos críticos e inaceitáveis do Decreto:

  1. Limita o direito à Consulta Prévia somente aos Povos Indígenas, Comunidades Quilombolas e Comunidades e Povos Tradicionais certificadas, pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), Fundação Cultural Palmares ou pela Comissão Estadual para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de MG. De forma similar, cria nova definição de territórios tradicionais condicionada à sua efetiva titulação e reconhecimento pelo Estado, violando mais uma vez o direito à autodeterminação dos Povos e Comunidades Tradicionais.
  2. Nega o direito de Consulta às Comunidades e Povos Tradicionais, cujos Territórios estejam localizados em áreas urbanas consolidadas. Isso afeta diretamente centenas de comunidades localizadas em zonas urbanas, como Povos de Terreiro, Indígenas em situação urbana, Acampamentos Ciganos e Comunidades Carroceiras. Particularmente, esse aspecto do Decreto favorece o avanço do licenciamento do Rodoanel (o famigerado Rodominério!) na Região Metropolitana de Belo Horizonte, afetando imediatamente o direito e os territórios de centenas de comunidades.
  3. Transfere às empresas a responsabilidade de realização da Consulta, no caso de projetos da iniciativa privada. Além de ser uma grave violação ao que determina a Convenção 169, isto poderá aumentar ainda mais a violência e assédio das empresas sobre os territórios.
  4. O Decreto também condiciona a exigência da realização de Consulta às situações em que os territórios estejam no máximo a 3 Km de distância dos empreendimentos, ignorando os impactos sistêmicos e difusos dos empreendimentos, seja pela circulação e fluxos do ar, das águas e das espécies nos territórios.

Não se pode ignorar a relação do Decreto com o contexto atual da política do Governo Zema, no qual o Governo apoia o avanço da mineração predatória, que tem por alvo, em grande medida, explorar áreas de Territórios Tradicionais, em diversas regiões do estado. Este Decreto é para “passar a boiada”.

Diante de tantas violações, reafirmamos nosso compromisso em garantir que os Povos e Comunidades Tradicionais tenham acesso à informação e possam participar ativamente dos processos que impactam seus modos de vida e exigimos a imediata revogação do Decreto Nº 48.893/2024, garantindo de forma plena o Direito das Comunidades e Povos Tradicionais à sua autodeterminação. Neste momento, em que a “terra geme em dores de parto” (Cf. Rm 8,22), é urgente avançarmos nas lutas concretas nos territórios, em defesa dos Povos e Comunidades Tradicionais e de todos os seres vivos que formam a comunidade que nutre nossa mãe Terra. Portanto, é absurdo um Decreto como este em tempos de Emergência Climática. As sirenes dos eventos extremos estão gritando de forma estridente. Revogação e Anulação do Decreto 48.893/2024, JÁ! Apelamos a todas as autoridades compromisso com a derrubada deste brutal Decreto.

Assinam esta carta:

  1. Comissão Pastoral da Terra – Minas Gerais (CPT/MG)
  2. Conselho Pastoral dos Pescadores – Minas Gerais (CPP/MG)
  3. Pastoral da Juventude Rural – Minas Gerais (PJR)
  4. Conselho Indigenista Missionário – Regional Leste (CIMI)
  5. Cáritas Brasileira –Regional Minas Gerais
  6. Rede Igrejas e Mineração – Minas Gerais
  7. Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES)
  8. Irmãs Franciscanas Missionárias Diocesanas da Encarnação
  9. Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade (AFES)
  10. Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia (SINFRAJUPE)
  11. Sociedade Brasileira de Etnobiologia eEtnoecologia
  12. Grupo de Pesquisa de Educação Popular PluriEtnoDecolonial-UNIMONTES
  13. Núcleo de Estudos e Pesquisas Regionais e Agrários – UNIMONTES
  14. Observatório dos Vales e do Semiárido Mineiro – UFVJM
  15. Observatório Fundiário do Vale do Jequitinhonha – UEMG Diamantina
  16. Kaipora-Laboratório de Estudos Bioculturais – UEMG Ibirité
  17. Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Campo (MTC)
  18. Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM)
  19. Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST/MG)
  20. Movimento de Ressurgência Purí-MRP Serra dos Purí
  21. Povos e Comunidades Tradicionais de Religião Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA)
  22. Associação Nacional de Ação Indigenista (ANAI)
  23. Terra de Direitos
  24. “Escola” de Direito Agrariambiental e da Jusdiversidade–Montes Claros
  25. Legião de Assistência Recuperadora -LAR
  26. Setor Ambiental do vicariato Episcopal para ação social, política e ambiental da Arquidiocese de Belo Horizonte – VEASPAM
  27. Saberes do Território, organização da sociedade civil para salvaguarda da sociobiodiversidade na região dos Inconfidentes .
  28. FONSANPOTMA
  29. Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME 
  30. Coletivo de Implantação do Campus Quilombo Minas Novas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais – IFNMG
  31. Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular

Obs.: Outras organizações, entidades e Movimentos Sociais que quiserem assinar esta Carta Aberta de Repúdio, favor enviar nome e e-mail para frei Gilvander: gilvanderlm@gmail.com

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