Na retomada da luta, a vida floresce e o bem viver acontece do jeito que a gente quer
Nós, povos e comunidades de territórios quilombolas, indígenas, de quebradeiras de coco babaçu, pescadores/as artesanais, sertanejos/as e camponeses/as, estivemos reunidos, entre os dias 25 e 30 de agosto de 2024, na comunidade Alegria, território Alegria, município de Timbiras, para o XV Encontrão da Teia de Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão. Nestes seis dias de intensas trocas e articulações, fizemos uma leitura tanto das forças que ameaçam a nossa existência, quanto da nossa potência de resistir, criar e lutar pelo nosso bem viver.
Ao compartilharmos nossas aflições, percebemos que todas as comunidades e povos tradicionais do Maranhão estão sendo brutalizados de forma muito semelhante pelo capital e pelo Estado. Nossos inimigos estão famintos por nossos territórios, expressando sua voracidade na grilagem de terras, criminalização e assassinatos de lideranças; nas queimadas; na expansão das boiadas e monoculturas (soja, eucalipto, milho, etc) do MATOPIBA; na guerra química que pulveriza veneno sobre nossos corpos, como arma de higienização, sobre nossas famílias, animais e roças; na derrubada e cercamento dos babaçuais e dos campos naturais; na tentativa de implantação de megaprojetos de infraestrutura, como linhões, portos e ferrovias (a exemplo do projeto Grão Pará Maranhão); no projeto de exploração de gás xisto; no roubo de madeira e no sequestro ou destruição dos nossos rios; na pistolagem, no trabalho escravo; na invasão dos nossos territórios e dos nossos sonhos com promessas enganosas, como faz o programa Maranhão Verde, de créditos de carbono, ou a CONAFER, que despeja dinheiro nas comunidades para adormecer resistências, ao mesmo tempo em que preside o Conselho do MATOPIBA; e nos projetos de transação energética, que tomam nossas praias e maretórios com seus dragões de vento, e nos ameaçam com sua sanha mineradora.
Ao mesmo tempo, o Estado, que devia nos proteger, não apenas é omisso e inoperante diante dos inúmeros ataques aos nossos territórios e comunidades, como muitas vezes é conivente, parceiro ou perpetrador das violações. Adota um explicito colonialismo interno, nos olhando com desdém, como se fosse natural que sejamos sempre nós os que devem ser sacrificados em prol do “desenvolvimento da nação”. Quando somos atacados ou assassinados, no lugar de acolhimento e proteção, o Estado oferece mediação com os inimigos. Nunca os pune, ao contrário, os financia e promove. Fecha os olhos para a barbaridade do Marco Temporal; licencia obras que nos atropelam; financia as monoculturas e a infraestrutura para exportação; ou desenvolve programas de falsas soluções climáticas, que depois nos enfia goela abaixo. Nem o direito de sermos ouvidos sobre o que nos ameaça, garantido pela Convenção 169 da OIT, o Estado tem respeitado.
Então, anunciamos que seremos a Teia das Retomadas. Vamos retomar nossas existências, nossa dignidade e nossas soberanias e Bem Viver. Vamos continuar vivos e mais fortes através das nossas culturas, espiritualidades e ancestralidades. Declaramos guerra à escassez crônica, ao quase nada, à fome, e vamos lutar pela plenitude da soberania alimentar e dos territórios livres e protegidos. Vamos intensificar o compartilhamento de saberes, sementes e tecnologias sociais. Vamos intensificar a formação política dos nossos desde o chão da vida. Vamos enredar na Teia os nossos jovens e as nossas crianças, para os quais os mais velhos são esteios, e vamos acolher e dar vazão às suas rebeldias e curiosidades. Vamos acolher nossas diversidades, e vamos à luta para defende-las. Acima de tudo, vamos nos proteger entre nós, vamos nos acudir quando preciso, e com a força da nossa solidariedade e espiritualidade, seremos uma potente rede de cuidados.
Sabemos o que rejeitamos e temos certeza do que defendemos. Somos a Teia dos Povos e Comunidades Tradicionais do Maranhão em marcha pelo Bem Viver e Territórios Livres!
Território Alegria, Timbiras-MA, 06 de setembro de 2024.