Foto: Equipe da CPT Alto Xingu
" Todas as formas de vida importam, mas quem se importa?
(Grito dos Excluídos 2024)
São Félix do Xingu/PA, 06 de setembro de 2024.
Na semana em que celebramos o Dia da Amazônia, somos obrigados a contemplar a triste elevação da fumaça que se espalha por todos os lados, enquanto nossa Amazônia queima, sofre e gradualmente se extingue diante de nossos olhos.
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Alto Xingu vem a público manifestar seu profundo repúdio e indignação, além de cobrar providências diante das queimadas – intencionais ou não – que estão devastando as cidades de São Félix do Xingu, Tucumã e Ourilândia do Norte, na região do Alto Xingu. Esses incêndios não são eventos isolados, mas sim o resultado de uma combinação perversa de negligência governamental, impunidade e desrespeito ao meio ambiente e às comunidades locais, não só aqui, como no país inteiro.
A destruição causada por essas queimadas tem impactos devastadores: não só na fauna e flora da região, mas também na saúde e qualidade de vida das populações que ali residem, especialmente as pequenas comunidades rurais e os povos indígenas. Um exemplo disso ocorreu no Assentamento Casulo II, em Ourilândia, onde, em 29 de agosto de 2024, o fogo se alastrou pelas unidades familiares, causando grandes perdas de plantações e criações de animais. Os moradores enfrentam momentos de profundo sofrimento e incertezas sobre as condições de permanência no lote, pois muitos moradores ainda estão sem acesso ao fornecimento de água e energia.
As comunidades de Novoeste, Xadá e Assentamento Belauto, acompanhadas pela CPT, também foram impactadas pelas queimadas e os impactos são gravíssimos. No Xadá, a densa fumaça que paira sobre a comunidade está impactando, inclusive, a rotina escolar. As crianças não conseguem respirar dentro das salas de aula e muitas passaram mal. O horário do ônibus escolar rural está alterado devido à baixa visibilidade das estradas, que coloca em risco a segurança dos estudantes.
Uma das maiores preocupações em relação aos impactos causados por este crime ambiental é com a subsistência das famílias impactadas, pois a perda da produção agrícola (especialmente a plantações de cacau, a principal atividade das famílias agricultoras) e das pequenas criações agravam a insegurança alimentar, piorando o quadro de vulnerabilidade dessas famílias que já enfrentam muitos desafios na prática da agricultura familiar. Enfrentam neste momento riscos e incertezas quanto à sua permanência nos lotes, tornando a situação cada vez mais crítica. A fumaça tóxica que se espalha pela região ameaça a vida da população rural e urbana, cobrindo cidades inteiras e afetando especialmente crianças, idosos e pessoas com condições de saúde pré-existentes. Além de contribuir para o agravamento das mudanças climáticas.
É inadmissível que, mais uma vez, estejamos diante de uma situação anunciada e prevista, sem que as autoridades competentes tenham um plano de ação pronto para lidar com a situação. A inércia do governo em fiscalizar e punir os responsáveis por essas práticas criminosas é um sinal claro de conivência com a destruição ambiental e com os interesses de grupos que se beneficiam desse caos, pois não basta apenas elaborar um decreto sem que haja ações que garantam seu efetivo cumprimento.
A ausência de políticas públicas voltadas para a prevenção é preocupante, especialmente considerando que incêndios ocorrem anualmente, causando prejuízos significativos principalmente aos pequenos agricultores. Apesar desse cenário recorrente, medidas repressivas são escassas e as ações preventivas praticamente inexistem.
Nunca houve a implementação de ações preventivas efetivas voltadas para o combate aos incêndios, sobretudo no período seco, em agosto. Não há apoio substancial para as brigadas de incêndio, que frequentemente atuam com poucos recursos e estrutura, mas que rapidamente atendem grupos com melhor poder aquisitivo, inclusive com o uso de helicóptero. E, acima de tudo, o Estado age de forma irresponsável e falha na proteção da comunidade e na garantia de seus direitos básicos, notadamente, o direito a um meio ambiente saudável e ecologicamente sustentável.
É urgente que os governos federal e estadual adotem medidas imediatas para conter os incêndios que já se alastram e prevenir a devastação de novas áreas. Entre essas ações, destacam-se a necessidade de implementação de políticas de assistência técnica para os lotes atingidos e o fornecimento de apoio emergencial em alimentos às famílias que perderam suas colheitas. Além disso, é fundamental estabelecer um plano de ação permanente e estruturado para prevenir futuras queimadas, assegurando a proteção do meio ambiente e a segurança das comunidades locais.
É fundamental uma repressão mais incisiva aos crimes ambientais. Observa-se uma aceitação generalizada da prática de atear fogo em pastos, o que torna ainda mais urgente a necessidade de conscientizar sobre os problemas associados a essa ação. É imperativa a necessidade de construção de uma mentalidade coletiva que busque novas formas de manejo sustentável da terra, que preserve o meio ambiente e garanta a sobrevivência das comunidades locais.
A CPT reafirma seu compromisso com a defesa da vida, do meio ambiente e dos direitos das comunidades do campo. Continuaremos a lutar incansavelmente contra a destruição do Alto Xingu e contra todas as formas de violência no campo e opressão que afetam os trabalhadores e trabalhadoras rurais.
Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Alto Xingu
Comissão Pastoral da Terra (CPT) Regional Pará
Instituto de Estudos do Xingu - Univ. Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa)
Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax)
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de São Félix do Xingu (STTR)
Caixa agrícola dos Colonos Unidos do Xingu (Cacuxi)
Associação Terra Roxa
Associação Casulo Dois dos Trabalhadores na Agricultura Familiar