Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações da CPT Regional Rondônia
Foto: Valdinei Coelho / CPT Rondônia
Mais de 28 anos depois do massacre de Corumbiara (RO), a comunidade, familiares e demais pessoas envolvidas ganham um espaço para honrarem a memória e fortalecerem a luta e resistência, para continuarem vivendo e produzindo no assentamento. A cerimônia de inauguração do espaço, realizada no último dia 02 de outubro, contou com a presença de lideranças de movimentos sociais, sindicatos, assentadas e assentados da reforma agrária, lideranças religiosas e políticas. Representando a Diocese de Guajará-Mirim, também esteve o pároco local, pe. Josiel Santos.
O monumento conta com um pedestal e placa de metal, personalizada de acordo com a escolha dos moradores, e está localizado no assentamento Alzira Augusto Monteiro, próximo ao local do massacre. A organização do memorial é coordenada por Valdinei Antônio Coelho (Nenzinho), e parceria e acompanhamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT) - Regional Rondônia.
A reivindicação pelo espaço começou no último mês de agosto, durante o lançamento das Referências Técnicas para Atuação das (os) Psicólogas (os) em Questões Relativas a Terra, publicação organizada pelo Conselho Regional de Psicologia Rondônia/Acre (CRP 24a Região). No momento de escuta, agricultores e agricultoras familiares falaram das dificuldades de atendimento psicológico no campo, sendo a política de saúde mental uma grande lacuna e demanda das comunidades camponesas, ainda mais agravada diante das violências enfrentadas.
Para o psicólogo Cleibson André Nunes Torres, presidente do CRP-24, o espaço servirá para relembrar o passado e olhar para o futuro.
“Nós somos solidários a esta causa desde o início, porque tantos anos depois, é um fato que ainda reverbera dentro das unidades de saúde e das escolas. Este espaço é pra que todos nós possamos dizer que se passaram 28 anos, mas a história continua. Não é um projeto ou palanque político, mas é pra que nós nunca mais esqueçamos o que aconteceu aqui, e também para reivindicarmos políticas públicas de demarcação e titularização de terra, que ainda não estão resolvidas no Brasil”, afirmou.
A opinião foi reforçada por Denise Monteiro, presidenta do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (STTR) de Cerejeiras e Pimenteiras: “É preciso lembrarmos do quanto aquelas mulheres sofreram, com suas filhas e filhos, seus companheiros. Penso que devemos nos organizar e manter o compromisso de sempre estar neste local, todos os dias 09 de agosto, pra relembrar o dia do massacre. Isto é reviver a história, honrar as vidas que foram perdidas e renovar a luta.”
“Este memorial é algo pequeno, diante da simbologia do que ocorreu aqui. Mesmo com a realização da prefeitura, este espaço é fruto das mãos e do suor de toda a comunidade”, afirmou o prefeito Leandro Teixeira Vieira, também presente no evento.
Já o agricultor Moacir Camargo, uma das vítimas sobreviventes do massacre, falou que mesmo com a marca muito dolorosa deixada pela violência, comemora a construção do memorial: “Hoje eu me sinto muito honroso, porque muitas crianças que nem tinham noção da violência na época, hoje são homens e mulheres assentadas, lideranças atuantes. Depois de tudo que passamos, somos vitoriosos; tiramos a terra da mão do latifundiário e hoje ela está nas mãos de quem realmente produz”, afirmou.
Ao final da cerimônia, foram plantados três ipês em torno do memorial, sendo a árvore escolhida como símbolo de resistência.
Histórico do massacre – A violência ocorreu em 09 de agosto de 1995, quando 8 trabalhadores rurais sem-terra, incluindo uma criança, foram mortos durante a madrugada, em uma investida de cerca de 300 pistoleiros e policiais contra um acampamento na ocupação da Fazenda Santa Elina, com bombas e tiroteio por cerca de quatro horas. A ação aconteceu de surpresa, enquanto as famílias dormiam. No confronto, houve reação dos trabalhadores e dois policiais morreram. Do lado dos sem-terra, além dos mortos, outras 20 pessoas ficaram desaparecidas, 350 gravemente feridas e 200 presas. A perícia e as investigações também apontaram casos de espancamento e tortura entre os sobreviventes. No julgamento acontecido em 2000, saíram condenados dois posseiros e três policiais militares.