COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

O Presidente da CPT enviou Cartas a deputados(as) pedindo a imediata rejeição da MP 910/19. Conhecida como MP da legalização da grilagem, a Medida representa a autorização de apropriação indevida de milhões de hectares de terras devolutas da União, ampliando de 1.500 para 2.500 ha a extensão das ocupações irregulares passíveis de legalização. Além disso, essa MP irá anistiar crimes ambientais e, também, o crime de exploração de trabalho em regime análogo à escravidão. Confira e pressione você também os e as deputadas para que não autorizem mais esse crime contra os povos do campo, das águas e das florestas:

Sr. Deputado

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Ai de vós que juntais casa a casa e campo a campo até não sobrar espaço para os mais pobres. (...) O Senhor os julgará com justiça” (Cf. Isaías 5,8.16).

Prezado Senhor (a)

A Comissão Pastoral da Terra, neste momento de Pandemia, preocupada com as consequências às milhares de pessoas empobrecidas no campo e na cidade, quer externar sua preocupação com a sobrevivência de camponeses e camponesas, deste imenso país.

Causa indignação que, apesar da crise que se agrava, o Congresso Nacional e o Governo Federal seguem levando a cabo um conjunto de políticas com potencial de aprofundar a crise econômica, social e ambiental pela qual passamos. Uma dessas medidas que agora se encontra em tramitação nessa casa é a Medida Provisória 910/2019.

Se aprovada a conversão, nos termos da Minuta de Relatório apresentada pelo senador Irajá Abreu, tal medida representará uma autorização para apropriação indevida de milhões de hectares de terras devolutas da União, pois amplia de 1.500 para 2.500 ha a extensão das ocupações irregulares passíveis de legalização.

A MP desloca o marco temporal da ocupação para até 09 de dezembro de 2018 e assim reduz prazo que elimina a exigência de ocupação histórica, requisito essencial ao reconhecimento da legitimidade da posse. Esta norma anistia crimes ambientais e, mais grave ainda, anistia também o crime de exploração de trabalho em regime análogo à escravidão. Além disso, acreditamos que esta medida só aumenta os números de Conflitos no Campo, que, em 2019, alcançou o maior número dos últimos 14 anos, 1.833 conflitos, ou seja, cerca de 05 conflitos por dia. No acompanhamento das comunidades camponesas nesse período de pandemia, observamos que a pressão continua, inclusive com invasão de áreas em posse das famílias em seus territórios.

A inclusão de pessoas jurídicas como beneficiárias da regularização fundiária e a dispensa de licitação, representa um verdadeiro crime contra a Administração Pública (lei nº 8.429/1992) e flagrante ofensa ao que prescreve a Constituição Federal acerca da regularização fundiária das terras públicas, sua destinação e compatibilização com a política agrícola e o plano nacional de reforma agrária (art. 188).

Nos últimos anos, muitos têm sido os retrocessos legislativos que têm marcado a agenda do Executivo Federal, principalmente a partir da instalação do atual governo, de desmonte dos órgãos de fiscalização e controle ambiental, de estímulo à grilagem, negação dos direitos das comunidades tradicionais, de subordinação à pauta ruralista e desprezo pela agricultura familiar. Mesmo assim, ainda causa consternação a edição da Medida Provisória em tela. Porque a regularização fundiária de terras federais já foi disciplinada pela Lei 11.952/2009 e esta foi inclusive alterada pela Lei nº 13.465/2017, conforme expressamente reconhecido pelo relator da MPV 910. Portanto, não há nenhuma justificativa para a iniciativa de promover novas alterações nas leis acima citadas, ainda mais através de uma modalidade legislativa reservada a situações excepcionais.

O objetivo de “novamente aperfeiçoar” a política de regularização fundiária, invocado na Exposição de Motivos, e a afirmação do Relator segundo a qual a Medida Provisória “contribuirá para a celeridade no procedimento de regularização fundiária no país”, mas de modo algum atendem aos requisitos de “urgência e relevância” exigidos artigo 62 da Constituição Federal para a edição de medidas provisórias.

Ao contrário, as principais alterações propostas poderão causar lesão ao patrimônio da União e ameaçam a integridade dos territórios das comunidades tradicionais, conforme a opinião de especialistas na matéria, vinculados por representantes dos movimentos sociais, as universidades públicas, centros de pesquisa, especialistas, exposta inclusive perante a Comissão Mista do Senado. Comunidades às quais a legislação nacional e a Convenção 169 da OIT asseguram o direito de serem devidamente consultadas quando da adoção de medidas legislativas ou administrativas que possam afetá-las, o que lhes foi negado ao ser adotada uma modalidade legislativa cuja tramitação impossibilita o efetivo exercício do direito de serem ouvidas.

Editada às vésperas de recesso parlamentar, a MP 910/19 mais parece ter sido motivada não pelo interesse público, mas como estratagema para ampliar o arsenal jurídico de estímulo à grilagem e práticas predatórias ao meio ambiente. Isto, quando os territórios tradicionais têm cada vez maior reconhecimento da ciência e da opinião pública de sua importância em tempos de crise climática e sanitária, porquanto preservam matas, nascentes, ecossistemas inteiros, e produzem alimentação saudável. Por fim, a situação de excepcionalidade que o Brasil está vivendo recomenda a imediata rejeição da MP 910/19.

Como já expresso por pesquisadores de diversas áreas, organizações sociais e ambientais, a gravidade desta epidemia exige mudanças radicais. A sociedade como um todo deve refletir criticamente sobre as formas de ocupação do espaço, padrões de consumo e o modelo predatório de produção e exploração do meio ambiente, e os governos precisam redirecionar suas políticas, ações que garantam a sobrevivência dos bens naturais e da humanidade. É o que cobra e espera a Comissão Pastoral da Terra.

Goiânia, 05 de maio de 2020.

Dom André De Witte

Presidente da Comissão Pastoral da Terra - CPT

 

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