COMISSÃO PASTORAL DA TERRA

 

Quatro estados brasileiros; 337 municípios; 73 milhões de hectares; 250.238 estabelecimentos da agricultura familiar. Estes números são parte do cálculo da abrangência do Plano de Desenvolvimento Agropecuário do Matopiba, instituído por meio do decreto n° 8447, publicado no dia 06 de maio de 2015.

 

(Por Elka Macedo, ASA/Imagem: Articulação das CPT's do Cerrado)

A ação abrangerá territórios dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, e, segundo o Governo Federal, tem o objetivo de “promover e coordenar políticas públicas voltadas ao desenvolvimento econômico sustentável fundado nas atividades agrícolas e pecuárias que resultem na melhoria da qualidade de vida da população”.

De acordo com o decreto, o Matopiba se baseia em três grandes diretrizes: desenvolvimento e aumento da eficiência da infraestrutura logística relativa às atividades agrícolas e pecuárias; apoio à inovação e ao desenvolvimento tecnológico voltados às atividades agrícolas e pecuárias; e ampliação e fortalecimento da classe média no setor rural. No entanto, a perspectiva da expansão do agronegócio, que ocupará 38% do território do estado do Tocantins, 33% do Maranhão, 11% do Piauí e 18% da Bahia para cultivo de soja, milho e eucalipto, vai ocasionar problemas ambientais, sociais e culturais. Neste sentido, movimentos sociais ligados ao campo, organizações e famílias agricultoras das regiões afetadas estão se articulando para denunciar os impactos negativos do Matopiba.

O coordenador regional da Comissão Pastoral da Terra (CPT) do Piauí, Altamiran Ribeiro, que tem acompanhado a luta das famílias no estado, revela alguns dos abalos sofridos. “O impacto da obra já está acontecendo. O pequeno se quiser produzir tem que se igualar aos grandes projetos, porque se o grande usa veneno, o pequeno tem seus cultivos e a água contaminados. O Matopiba atinge não só o Cerrado, mas também o Semiárido e afeta economicamente a vida das famílias. Com a expansão dos latifúndios o custo de vida dos municípios tem subido cerca de 300%. Isso também mexe com a cultura, pois mesmo sem perceberem eles estão perdendo as suas tradições para se adequar a um novo modelo de cultura. Tudo isso ocasiona o esvaziamento do campo”, salienta.

Em Carta aberta à Sociedade Brasileira, à Presidência da República e ao Congresso Nacional sobre a destruição do Cerrado pelo MATOPIBA, elaborada no Primeiro Encontro Regional dos Povos e Comunidades do Cerrado (foto acima), construída e publicada em novembro do ano passado, os cerca de 170 participantes do evento que representavam diversos povos que habitam a região ressaltaram que “O PDA Matopiba não representa desenvolvimento, pois atinge os modos de vida das comunidades do Cerrado e não é um projeto de desenvolvimento sustentável, pois “mata” a água, a terra, o bem viver dos povos indígenas, quilombolas, camponeses e demais comunidades”.

A delimitação territorial do MATOPIBA impactará, agressivamente, as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul (Amazônica/Araguaia-Tocantins, São Francisco e Prata), e a mais rica biodiversidade brasileira. A obra comprometerá a vazão dessas fontes de água, como afirma Altamiran.

“A área do projeto Matopiba é onde ficam nascentes de rios como o Parnaíba e Tocantins. Com o desmatamento vai baixar a água, além disso, será construída uma ferrovia que vai passar em áreas de Cerrado que são habitadas por comunidades. Além disso, está havendo investimento internacional na obra, compra de terras griladas. Para se ter ideia um hectare de terra está sendo vendido a 60 mil reais”, assegura. 

Embora o primeiro grande critério de delimitação territorial do Projeto tenha tido como base as áreas de Cerrados existentes nos quatro estados, a ação também implicará na ocupação de áreas de Caatinga e Amazônia. No Semiárido piauiense, o Matopiba prevê inicialmente a extração de calcário e de minério de ferro.

Violência e expulsão de camponesas/es

Segundo dados do Caderno de Conflitos no Campo – Brasil (CPT, 2015), nos últimos cinco anos, nos estados do Maranhão, Tocantins, Bahia e Piauí ocorreram um total de 3.076 conflitos por terra e por água com ações de violência contra os camponeses e os povos tradicionais. Deste total de conflitos por terra e água, 1.643 ocorreram dentro da área delimitada pelo MATOPIBA, ou seja, 53,4% dos conflitos, envolvendo diversos sujeitos.

“O projeto com seu montante de ações de cunho exploratório vai excluir ribeirinhos, quilombolas e comunidades tradicionais de seus territórios. Já tem estudo sobre os impactos, mas há muito para ser feito para coibir a violência e negação de direitos dessas populações”, salienta o coordenador da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) pelo estado do Maranhão, Juvenal de Sousa.

Em entrevista concedida à Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), Paulo Rogério Gonçalves, membro da Alternativa para Pequena Agricultura no Tocantins (APA-TO) enfatiza que o Matopiba fortalece processos históricos de violência no campo. “No fundo o MATOPIBA fortalece o processo de violência agrária, querem aportar mais capital para que isso continue. Por outro lado, essa grande região é a mais preservada de áreas remanescentes de Cerrado que temos no Brasil. Será a destruição do Cerrado para a expansão das monoculturas, afirma um processo de desmatamento na região”.

Outro aspecto que Paulo Rogério elucida está ligado ao trabalho escravo. “Esses quatro Estados são os que têm um índice altíssimo de trabalho escravo. Todo esse processo de violência agrária e ambiental vem junto com um processo de escravização dos trabalhadores para o preparo de solo, limpeza de terreno e plantação do agronegócio”, destacou.

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