“Por meu povo em luta vivo, com meu povo em marcha vou!”: Comunidades do campo e agentes pastorais discutem as Linhas de Ação no V Congresso Nacional da CPT

da Equipe de Comunicação Antônio Canuto para o V Congresso Nacional da CPT
Após quatro dias de celebração dos 50 anos da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de partilha de experiências dos povos e comunidades de todo o país e de diversos momentos de escuta e debate, o V Congresso da Pastoral chegou ao seu quinto e último dia (sexta-feira, 25/07), no Instituto Estadual do Maranhão (IEMA). Os momentos finais contaram com a emoção dos abraços e os sons dos tambores, que também marcaram a abertura do evento.
Havia, no olhar de cada uma das mais de mil pessoas participantes – um número recorde nos cinco Congressos da CPT –, uma mistura de alegria pelos dias de convivência, e também a saudade na despedida do calor úmido da “cidade dos azulejos, dos prédios antigos e das casas coloniais”, dos sons dos tambores, da alegria das danças e da espiritualidade que guiou todos esses dias. Mas os corações também estavam cheios de inspiração, levando conhecimento e energia renovada para as lutas nas comunidades.

Uma das mulheres inspiradas é Maria Dilvânia, do Assentamento Ursulina, em Caraúbas (RN), que veio na caravana do regional Nordeste 2 com mulheres de assentamentos vizinhos, compartilhando as experiências de resistência através da agroecologia, da convivência com o semiárido potiguar e da articulação coletiva, superando o machismo, a opressão e a violência. (A experiência de Tecer Teias, apresentada na tenda Tambor de Crioula, está disponível no Caderno de Experiências – pág. 90.)
“No começo, era difícil a gente sair de casa, viajar e participar dos intercâmbios, da Marcha das Margaridas e de eventos como esse, por causa dos maridos que eram contra. Até no sindicato de trabalhadores rurais a gente não tinha voz, mesmo precisando da nossa presença para as reuniões acontecerem. Hoje, a gente se posiciona, e não tem quem me ‘empate’ de sair”, afirma Dilvânia, que desde quando começou a participar das mobilizações, aprende as músicas da luta e as compartilha com companheiras da comunidade. Junto dela, Alexsandra Farias, do Assentamento São José, também em Caraúbas, lembrou das experiências de outras comunidades que enfrentam conflitos e violências extremas, mas com a mesma determinação de lutar pelo território.
“Entra na roda com a gente”: A celebração da Festa das Comunidades
Na noite anterior, a tenda principal do Congresso foi tomada por 15 apresentações, celebrando a diversidade dos povos do campo, das águas e das florestas, não apenas do multicultural Maranhão, mas das diversas regiões do país, representadas no forró, ciranda, coco, cacuriá, samba e diversos outros ritmos.

O ponto alto da noite foi a apresentação do Bumba-Meu-Boi Flor do Brasil, do Quilombo Onça, localizado no município de Santa Inês (MA), chamando todo mundo para cantar, dançar e fazer ‘zoada’. Com o tradicional sotaque mais compassado da Baixada (ou do Pindaré), e acompanhadas pela magia e a brincadeira dos Cazumbás, as toadas do boi sempre lembravam de agradecer e saudar “o irmão Moquibom e a mãe CPT”, que acompanham e caminham junto com as comunidades quilombolas.



Apresentação do Bumba-Meu-Boi Flor do Brasil. Fotos: Heloísa Sousa
A experiência de Romper Cercas, sobre a resistência dos Quilombos Tanque da Rodagem/São João e Onça contra a grilagem, o desmatamento e os incêndios ilegais, está disponível no Caderno de Experiências – pág. 30.
“Somos povo semente de uma nova nação”: O debate das linhas de Ação nas Tendas e na Plenária principal
Com base nas conclusões das plenárias, as camponesas, camponeses e agentes se reuniram novamente nas tendas, discutindo as linhas de ação da CPT para os próximos cinco anos e apontando luzes para que a Pastoral continue a sua missão profética, enquanto peregrina da esperança e do esperançar. Toda esta escuta teve o acompanhamento de assessoras e assessores, que fizeram uma síntese das propostas a serem apresentadas, discutidas e aprovadas na grande plenária.


Debate das linhas de Ação nas Tendas. Fotos: Felipe Correia
Quatro linhas de ação foram organizadas, com diversas prioridades apontadas por agentes pastorais, trabalhadoras e trabalhadores:
- Terra e Território;
- Pastoralidade, Fé e Espiritualidades;
- Relações de Gênero e Étnico-raciais, Mulheres e pessoas LGBTQIAPN+;
- Juventudes.
Ao mesmo tempo em que as lutas se dão pelo “Romper Cercas” – a resistência ao agronegócio e a denúncia das violências, também se dão pelo “Tecer Teias”– na luta pela reforma agrária, pelo acesso às águas, o fortalecimento das alianças em redes, a formação pastoral e tantos outros caminhos de Bem Viver.
Avaliando as Linhas de Ação, uma nova Fila do Povo se formou, reafirmando as propostas discutidas nos grupos, e a necessidade de prosseguir nas lutas de enfrentamento ao agronegócio, aos megaprojetos de energias renováveis, mineração e infraestrutura, ao mercado de carbono e demais projetos desenvolvimentistas e do “capitalismo verde”.

Falas das comunidades e de agentes também reforçaram a necessidade de ações de incidência sobre os processos legislativos, com maior presença nos espaços públicos. Também apontaram a necessidade de trabalhar mais cartografias sociais, para que as comunidades conheçam melhor seus territórios e sejam reforçadas na defesa deles, na resistência através de métodos de não-violência ativa e do Bem Viver. Em todo este processo, a Comunicação na CPT foi incluída nas propostas, para que prossiga sua dimensão estratégica de fortalecer a luta das comunidades, na denúncia das violências e no anúncio do projeto camponês.


O momento também contou com apresentação de Moções e aprovação pela Plenária. Fotos: Renata Costa / CPT NE 2
A necessidade de proteção, autocuidado e cuidado coletivo para as comunidades e agentes pastorais também foi apontada, dado o reconhecimento de adoecimentos, sobrecarga e vulnerabilidade das lideranças e agentes no enfrentamento aos conflitos, e sob os riscos crescentes do narcotráfico nas comunidades. Também estão incluídas propostas de redes de proteção, acolhimento e cuidado coletivo para as mulheres, crianças e pessoas LGBTQIAPN+, da CPT e dos territórios.
“E nesta festa onde a gente é irmã e irmão, o Deus da vida se faz comunhão”
A emoção dos abraços e os sons dos tambores falando junto com o povo, que marcaram a abertura e chegada do evento, também foram marcantes na celebração do envio para as comunidades, e do almoço em seguida.


Celebração de envio encerrando o V Congresso da CPT. Fotos: Helenna Castro / CPT-BA
Além dos louvores, celebração da Palavra e a confraternização das caravanas vindas dos regionais, os últimos momentos do Congresso contaram com diversos agradecimentos às equipes que atuaram na frente e nos bastidores: Coordenação, Metodologia, Infraestrutura, Animação, Cozinhas e Comunicação.

Religiosas e religiosos presentes também foram chamados, como demonstração da pastoralidade e espiritualidade que sempre caminham ao longo dos 50 anos de acompanhamento da CPT junto aos povos e comunidades tradicionais. Sendo uma sexta-feira, dia sagrado para diversas religiões de matriz africana, Ana Emília Moreira Santos, do Quilombo Matões dos Moreiras, em Codó (MA), ressaltou a reverência ao Pai Òsàlá, o maior de todos os orixás, através do canto “Oní Sáà wúre” (O Senhor do Tempo), cantado no idioma yorùbá pelo Candomblé de etnia Kétu. A louvação exalta o poder supremo de Olódumare – Olórun (Deus), e pede bênção e axé.
“A gente se emocionou muito neste Congresso, porque a gente consegue viver a Igreja-povo que nos faz falta nas nossas comunidades. Infelizmente vemos nos domingos, nas missas, um Cristo que não é o Cristo sintonizado com as lutas do povo. Eu volto com a ansiedade e a preocupação de discutir e incentivar para que as pastorais sociais, os grupos de reflexão, as CEBs, se fortaleçam e não sejam destruídos pela ala reacionária que tem ocupado as nossas comunidades.” (Marinilda, de Rondônia)

Confira as Cartas, Notas e Moções aprovadas e publicadas no V Congresso – https://cptnacional.org.br/acervo/biblioteca/
Página especial do V Congresso – https://cptnacional.org.br/congresso/v-congresso/