COMUNIDADE TRADICIONAL DE PESCADORES SOFRE DESPEJO EM MINAS GERAIS
Famílias moradoras da comunidade de Paraíso denunciam demolição de casas sem retirada de pertences. Ministério Público Federal e Polícia Militar bloquearam acessos já nas primeiras horas da manhã
Por Coletivo de Comunicação MAB MG

Na madrugada desta quarta-feira (3), por volta das 5h da manhã, cerca de 30 núcleos familiares de pescadores tradicionais da comunidade de Paraíso, em Felixlândia (MG), foram surpreendidos por uma ação de despejo conduzida pelo Ministério Público Federal, com apoio da Polícia Militar de Minas Gerais. As estradas de acesso foram bloqueadas pelas forças policiais, impedindo a entrada e saída de moradores.
Segundo relatos, a maior parte das casas foi demolida antes que as famílias conseguissem retirar seus pertences. Geladeiras, colchões e roupas ficaram espalhados pelo chão entre os entulhos. Muitos pescadores que estavam fora no momento da operação foram impedidos de retornar.
A polícia apresentou uma notificação do Ministério Público Federal, assinada pelo procurador Frederico Pellucci, ordenando a retirada das famílias por estarem assentadas em Área de Preservação Permanente. Porém, não foi apresentada nenhuma ordem judicial. A ação fere a legislação vigente e constitui grave violação de direitos fundamentais. Além disso, muitas famílias sequer tiveram tempo de retirar seus pertences, resultando na destruição imediata de bens acumulados ao longo de uma vida de trabalho.
Silvana Gomes da Rocha, pescadora que vive na comunidade há mais de uma década, relatou o impacto do despejo.
“Hoje, em vez de tirar meu peixe, acordei tentando salvar o que restou do meu rancho. Estou me sentindo como se a justiça tivesse nos jogado no lixo. É devastador ver nossas coisas espalhadas no relento, sem prazo para nada. A ação foi feita escondida, ninguém sabia de nada. Liberaram a passagem só à noite. Como carregar nossas coisas no escuro se aqui não temos luz?”, desabafou.
Apesar de estar localizada em Área de Preservação Ambiental, a comunidade já havia sido reconhecida no processo de reparação referente ao crime socioambiental da Vale em Brumadinho. O território é ocupado por famílias de pescadores há aproximadamente 15 anos, que dependem da represa para sobreviver. Para Eliana Marques, outra moradora despejada, a ação foi marcada pela violência e pela sensação de injustiça.
“A gente não é bandido, é pescador. Lutamos muito para construir nossos ranchos com sacrifício e trabalho honesto. Chegaram com toda a truculência, não deixando ninguém entrar, nem sair. É um território pesqueiro de mais de 30 anos e destruíram tudo. Primeiro, a Vale já nos prejudicou, agora vem a SEMIG, a polícia, e terminam de nos fragilizar. Parece que todo dia combinam de acabar com o pescador”, afirmou.

Até o momento, nem a Polícia Militar nem o Ministério Público Federal apresentaram informações oficiais sobre o futuro das famílias.
Em nota, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) repudiou esta postura das estruturas de Estado que tratam trabalhadores e trabalhadoras, vítimas de um crime socioambiental, como criminosos, enquanto a verdadeira criminosa, a mineradora Vale, segue impune. O MAB declara ainda solidariedade à população da comunidade de Paraíso e afirma que seguirá junto às famílias na luta por uma solução diante de mais esse crime sofrido pelo povo atingido.
Confira aqui a nota na íntegra.