Carta Profética das Juventudes da CPT

22 de julho de 2025
“Por Memória, Resistência e Esperança Jovem no Campo”
Nós, juventudes camponesas, indígenas, quilombolas, ribeirinhas e periféricas, reunidas na missão profética da Comissão Pastoral da Terra (CPT), elevamos nossa voz, marcada pela dor, pela memória e pela esperança, para denunciar as estruturas que seguem ceifando a vida da juventude brasileira.
É com profundo pesar que nos unimos em solidariedade pela perda irreparável de três jovens militantes da Universidade Federal do Pará (UFPA), que tiveram suas vidas interrompidas em um acidente a caminho do Congresso da UNE (CONUNE). Jovens que sonhavam com um Brasil mais justo e, com seus corpos em luta, insistiam em fazer da vida um instrumento de transformação. Suas partidas não serão em vão — são sementes lançadas à terra fértil da nossa resistência.
Memória que nos convoca à firmeza e à ação. Honramos suas trajetórias erguendo com mais coragem as bandeiras da justiça, da dignidade, do direito à vida e ao território. Seguiremos em marcha até que a liberdade floresça nos campos, nas favelas, nos quilombos, nas aldeias, nos rios e nas florestas.
A CPT, enquanto presença solidária e profética junto aos povos do campo, das águas e das florestas, reafirma seu compromisso com uma juventude que insiste em existir, mesmo diante da necropolítica que se abate especialmente sobre os corpos negros, pobres e periféricos. O Estado brasileiro, historicamente estruturado sobre o racismo e o colonialismo, segue promovendo a militarização da vida, criminalizando lideranças, encarcerando sonhos e assassinando o futuro de uma geração.
Não é acidente: é projeto do capitalismo.
A morte precoce da juventude negra, em especial nos centros urbanos, é parte de uma política sistemática de extermínio. No campo, essa lógica se intensifica com a omissão e a conivência do Estado frente ao avanço do agronegócio, da grilagem, da mineração e do desmonte dos direitos territoriais. A juventude que ousa resistir é silenciada, perseguida, vigiada. Em 2024, o Brasil voltou a ocupar o topo da lista dos países que mais matam defensores da terra e do meio ambiente, entre eles, jovens lideranças camponesas e indígenas.
Somos juventudes do Cerrado, da Caatinga, da Amazônia, Mata Atlântica, Pantanal e dos Pampas. Juventude que semeia, que cuida, que sonha com um modelo de vida justo, solidário e agroecológico. Denunciamos com veemência todas as formas de opressão: o machismo que fere e mata nossas companheiras, a LGBTfobia que exclui, o racismo estrutural que nos criminaliza e tenta apagar nossa história e ancestralidade.
Rejeitamos a ausência histórica de políticas públicas efetivas que garantam a permanência da juventude no campo com seu modo de vida. A sucessão rural está ameaçada pela negação do direito à terra, à educação do campo, ao crédito, à assistência técnica com recorte geracional e à valorização dos modos de vida tradicionais. A juventude quer permanecer em seus territórios com dignidade. Para isso, exigimos a ampliação e execução de políticas como o PRONAF Jovem, o Pronera, EFA’s, a ATES (Assessoria Técnica Social, Ambiental à Reforma Agrária) com recorte de juventude e o cumprimento urgente do Plano Nacional de Juventude e Sucessão Rural.
A nossa resistência é organizada. Sabemos que só haverá transformação verdadeira com um projeto popular para o Brasil, construído desde os territórios e enraizado na justiça socioambiental e na soberania popular.
Por isso, reafirmamos: Assumimos os seguintes compromissos proféticos e históricos:
- Fortalecer a organização das juventudes nos territórios acompanhados pela CPT, ampliando espaços de formação, articulação e protagonismo.
- Cuidar da Casa Comum e defender a vida em todas as suas expressões, humanas e não humanas, contra a lógica do lucro e da destruição.
- Lutar por políticas públicas estruturantes que garantam a permanência da juventude no campo com dignidade, acesso à terra, educação, cultura e saúde.
- Reafirmar a agroecologia como caminho de liberdade, soberania alimentar, justiça racial, de gênero e ambiental.
- Valorizar e preservar a cultura, espiritualidade e os saberes dos povos do campo, das águas e das florestas, como forma de resistência ao colonialismo e ao apagamento histórico.
- Construir pontes entre as gerações, escutando quem tem grande acúmulo histórico e abrindo caminhos para os que virão.
- Denunciar as estruturas de morte que assolam nossas comunidades: o agronegócio, o latifúndio, a mineração, os projetos de energia renováveis ou não, o patriarcado, o racismo institucional e o modelo de Estado que prioriza o capital em detrimento da vida.
Somos juventudes em movimento, raiz profunda e broto novo. Somos denúncia e anúncio. Somos vozes que rompem o silêncio das cercas para tecer redes de solidariedade, justiça e libertação.
À juventude tombada, nossa homenagem. À juventude viva, nossa luta! Com fé nos povos, com fé na terra, com fé na juventude que resiste e floresce.
Coletivo de Juventudes da Comissão Pastoral da Terra – CPT
Leia também: