“O agronegócio veio para matar o planeta e nós somos esse planeta”: Povos e comunidades do campo denunciam violências e partilham resistências no V Congresso Nacional da CPT
Evento que celebra os 50 anos de atuação da Comissão Pastoral da Terra acontece em São Luís (MA) entre os dias 21 e 25 de julho
da Equipe de Comunicação Antônio Canuto para o V Congresso Nacional da CPT

A tarde do primeiro dia (21) do Congresso Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT) foi marcada pela partilha dos clamores do “chão das realidades” de povos e comunidades camponesas onde a Pastoral desenvolve seu trabalho de base em diferentes regiões do Brasil. O evento apresenta o tema “Presença, Resistência e Profecia – Romper Cercas, Tecer Teias: A terra a Deus Pertence! (cf. Lv 25)”.
A pluralidade de identidades e de modos de vida tradicionais marcou a composição da mesa de diálogo que começou às 14h. O espaço contou com a participação de Marli Borges, da Comunidade Quilombola Guerreiro, de Parnarama (MA); de Genilson Magno, da Comunidade Jaranduba da Ilha Caviana, em Chaves (PA); de Irani Gomes, quebradeira de coco babaçu do município de Praia Norte, no Bico do Papagaio (TO); de Cristovino Ferreira Neto, geraizeiro do Assentamento Americana, de Grão Mogol (MG); e de Marivaldo Ferreira Barros, do Assentamento Nova Conquista, de Itiúba (BA).

A atividade pautou os desafios, as demandas políticas e as mais diversas formas de resistência que as comunidades constroem coletivamente para enfrentar a conjuntura de violências que ameaçam seus territórios e suas vidas no campo. “A fala de vocês será o nosso lastro, será a base para as discussões e reflexões que construiremos aqui neste Congresso a partir de hoje”, destacou Carlos Lima, da coordenação nacional da CPT, ao tratar da importância da escuta atenta às realidades dos povos do campo.
Ao longo da semana serão publicados textos que apresentam destaques das falas dos participantes da mesa sobre o “Chão da realidade dos povos e comunidades que a CPT atua”. Acompanhe o site e os canais de comunicação da CPT e fique por dentro.
Neste primeiro texto apresentaremos um pouco do que foi compartilhado por Dona Marli Borges, uma das guerreiras do Quilombo Guerreiro.

Famílias guerreiras
Marli Borges, liderança quilombola, abriu os trabalhos da mesa partilhando sobre as batalhas que a Comunidade Guerreiro (Parnarama/MA) trava há décadas pelo direito à sua terra ancestral. As famílias do Quilombo foram expulsas de seu território tradicional em 2009 por conta de uma ação judicial de reintegração de posse, mas conseguiram retomar suas terras em 2011, a partir da união e mobilização coletiva da Comunidade. “Um palitinho só é fácil de quebrar, mas quando se unem, fica difícil. Então a comunidade se uniu e fomos retomar nosso território”, destacou.
O período que as famílias passaram fora de suas terras por conta da expulsão judicial e da negligência do Estado foi marcado por intenso sofrimento, pois para os povos do campo, das águas e das florestas, o território é fonte de vida. É parte de suas vidas. Foi o que explicou a liderança quilombola: “Não conseguimos plantar a nossa roça e por isso ficamos desesperados, pois é da roça que a gente vive. É da roça, da caça, da pesca, da coleta de frutas do Cerrado. É dessa forma que tiramos o sustento para o nosso viver”.
Apesar da reconquista do território, Marli contou que as famílias do Quilombo enfrentaram ainda mais dificuldades e desafios, que persistem até hoje. As ameaças se intensificam a cada ano e o assédio do agronegócio da região, combinado com a ação tendenciosa das forças de segurança pública do Estado, se traduzem em ameaças constantes às vidas e ao território dos moradores da Comunidade.
Desmatamento, ataques com agrotóxicos, ameaças de morte e incêndios criminosos são algumas das formas de violência presentes na Comunidade Guerreiro e em outros territórios quilombolas da região do leste maranhense, situados nas proximidades da Comunidade, como os Quilombos Cocalinho, Tanque da Rodagem e São João, que já receberam o apoio da Pastoral da Terra.
“Graças a Deus a gente encontrou a CPT e aprendemos sobre nossos direitos, aprendemos como nos unir com as outras comunidades, sobre a nossa identidade quilombola”, contou Marli, ao mencionar a parceria da Pastoral da Terra junto às comunidades da região.
“Nós tínhamos muita água, hoje não temos mais. Nós tínhamos muita caça, hoje não temos mais. Eu acredito que não é só na minha comunidade, mas no Maranhão todo e até no Brasil. O agronegócio veio para matar o planeta e nós somos esse planeta”, clamou a liderança quilombola.