Lei que anistia grilagem pode ter propiciado novo Massacre no Campo de Rondônia

Na segunda-feira, 16 de junho de 2025, o vereador Silvano Pessoa, de Vilhena (RO), descobriu três corpos carbonizados no meio das cinzas duma casa queimada, no sítio de Josenir Vieira de Oliveira, de 57 anos, um pequeno agricultor que morava na Linha 140, a 60 km da cidade. A situação pode ser considerada um novo massacre no campo de Rondônia, em uma região já marcada por conflitos e violência agrária.
Diante da falta de exames de DNA confirmando as identidades dos restos calcinados, acredita-se que correspondem ao próprio Josenir Vieira de Oliveira (57), seu parente Álex Oliveira (44) e a companheira dele, Luciana Cristiano de Souza (36).
Álex e Luciana estavam desaparecidos desde o sábado (14), quando tinham anunciado uma visita ao sítio de Josenir e não tinham voltado nem no sábado nem no domingo. Álex era assessor do vereador Silvano.
O morador da casa queimada, Josenir, tinha sido eleito em abril de 2023 como presidente da Associação de Pequenos Produtores do Vale do Lambari (ASPROVAL), associação com CNPJ registrada com sede no Lote 15, Setor 12 da Gleba Corumbiara, na área rural de Vilhena, que ele tinha ajudado a criar e conseguiu registrar legalmente.
A ASPROVAL uniu as famílias de posseiros que ocupam de forma mansa e pacífica o Vale do Lambari, uma área de terra pública situada nas proximidades da disputada área da Fazenda Vilhena do Pensamento, um antigo latifúndio que já foi palco de várias chacinas, uma delas acontecida nas proximidades em 2015.
Informações também dão conta de que, em março, Josenir tinha procurado o vereador Silvano Pessoa, onde Álex Oliveira trabalhava como assessor, denunciando ter parte do seu sítio invadido por um grupo de grileiros e de receber ameaças. Também tinha deixado o cargo na associação por desentendimentos por causa das invasões que estava sofrendo, e em áudios ao grupo da associação, denunciou que estavam planejando assassiná-lo.

No sábado (14), o assessor Álex Oliveira comunicou para o vereador Silvano que estavam indo visitar Josenir. Mas depois de dois dias sem retornar nem darem notícias, procurando Álex e a namorada dele, o vereador Silvano acabou descobrindo os restos dos três no sítio de Josenir, na segunda-feira (16).
Tudo indica que as invasões de terras do posseiro possam ser a causa do novo massacre no campo de Rondônia. Moradores regionais também relatam, nas proximidades, a presença de milícias armadas e de numerosos capangas de madeireiros invasores de terras indígenas, e seguranças de fazendas em litígio agrário nas imediações da fazenda Vilhena. O caso segue sendo investigado pela polícia judiciária.
As comunidades também relatam que contribui para o acirramento dos conflitos a atuação de escritórios de técnicos, que cobram valores exorbitantes e abusivos das pessoas, faturando muito dinheiro fazendo georreferenciamento e Cadastro Ambiental Rural (CAR) de forma irregular nestas áreas. Lideranças corruptas também vivem de especular e de lotear áreas sem ter posse, para comercializar e garantir a regularização fundiária baseada na lei.
O massacre no campo e a relação com a Lei 14.757
Por outro lado, existe a suspeita que estas novas grilagens de terras e este massacre possam ter sido propiciados pelas perspectivas jurídicas de anistia da grilagem que a Lei 14.757/2023 trouxe para ordenamento, ao entregar as terras públicas a antigos licitantes que não cumpriram os termos dos contratos de concessão destas glebas na Amazônia.
Confira aqui a Nota Pública emitida por organizações de Rondônia sobre os perigos desta Lei para a grilagem de terras no Estado.
A lei prevê anistia das cláusulas resolutivas de áreas de até 960 hectares, ou seja, dispensa da falta de pagamento terras públicas, e apesar da não realização das benfeitorias estipuladas nos contratos, acaba entregando as terras da União aos titulares dos contratos da época da ditadura militar, mesmo que nunca tenham pisado em Rondônia, nem pago nenhum valor, nem plantado um pé de capim.
Durante a sua tramitação, a Câmara dos Deputados foi aprovada a anistia para as áreas com até 2.500 hectares, contudo o Senado manteve o limite da proposta original, contudo sem que este debate tenha saído da pauta, a sanha dos grileiros em se apropriar das terras públicas para o mercado especulativo e a monocultura para exportação.
Esta lei foi aprovada pelo Congresso em 2023, derrubando o parecer da AGU e o veto do Presidente Lula por inconstitucionalidade. Se aplicada, vai prejudicar muitas milhares de famílias de pequenos agricultores do Cone Sul de Rondônia, da região de Ariquemes e de outros estados da Amazônia. Posseiros legítimos que moram e trabalham há décadas nestas antigas áreas abandonadas, pleiteando o assentamento ou a regularização fundiária, mas impedidos pelos antigos títulos provisórios no papel, inclusive, muitas das que já tinham sido anuladas pelo Incra e pelo programa Terra Legal ou com processos de verificação de cumprimento das cláusulas em tramitação para verificar o cumprimento das cláusulas resolutivas. Incentivando de novo a violência, a correria e o saqueio das terras públicas da Amazônia.
Importante destacar que, para resolver a questão das titulações para pequenos agricultores, o Brasil já possui normas que poderiam ser aplicadas para resolver estas demandas, contudo, camuflando os verdadeiros interesses do agronegócio e a ineficiência dos órgãos para atender os pequenos agricultores, se avança no risco de lavar a grilagem na Amazônia.
Por Josep Iborra Plans (assessor da CPT),
com informações da CPT Regional Rondônia