CNDH publica recomendação para legitimação e cumprimento da Declaração dos Direitos dos Camponeses pelo Estado brasileiro
Recomendação é resultado de um trabalho conjunto entre Via Campesina, CPT e CNDH
Por Júlia Barbosa | Comunicação CPT Nacional
O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) publicou, no início deste mês, a Recomendação nº 05, de 05 de junho de 2025, que sugere a “a adoção das providências necessárias para observância, publicização e cumprimento da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Camponeses”. Essa publicação é resultado de um trabalho colaborativo com a Via Campesina, por meio do Coletivo de Direitos Humanos, integrado também pela Comissão Pastoral da Terra, que junto à Comissão Permanente dos Direitos dos Povos Indígenas, Quilombolas, dos Povos e Comunidades Tradicionais, de Populações Afetadas por Grandes Empreendimentos e dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Envolvidos em Conflitos Fundiários, do CNDH, se empenhou em editar a recomendação ao Estado brasileiro e demais instituições visando a incorporação do documento.
A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Camponeses e Outras Pessoas que Trabalham em Áreas Rurais foi aprovada pela ONU em dezembro de 2018. Ela é um instrumento estratégico para o fortalecimento das lutas e dos modos de vida dos povos e comunidades do campo, das águas e das florestas, com cerne no direito à terra, à água e à biodiversidade.
O documento invoca que camponeses e camponesas não sejam apenas “sujeitos de direitos”, mas os reconhece como agentes essenciais para superação das crises. À época da aprovação pela ONU, período em que o Brasil elegia o governo de extrema direita de Jair Bolsonaro, que demonstrou durante os quatro anos de mandato seu descaso e desprezo pelos direitos e pela vida dos povos do campo, o país se absteve do voto de aprovação.
Hoje, com o aprofundamento das crises socioambientais e climáticas, pelo avanço do capitalismo no campo e em grande parte resultado de políticas de facilitação da comercialização e exploração da natureza – como o PL da Devastação, aprovado pelo Senado no último 21 de maio, que flexibiliza o licenciamento ambiental para empreendimentos -, as organizações cobram providências para que o Estado brasileiro legitime os termos da Declaração e promova políticas públicas para efetivar os direitos nela dispostos.

Conflitos no campo violam os direitos dos povos
A Recomendação considera os dados de violência no campo registrados pela Comissão Pastoral da Terra, lançados no último 23 de abril, na publicação Conflitos no Campo Brasil 2024, que revelam a realidade violenta vivenciada pelos povos e comunidades camponesas no contexto dos conflitos por terra, água e condições dignas de trabalho. Segundo os dados do Centro de Documentação Dom Tomás Balduino/CPT, o ano passado apresentou o segundo maior número de conflitos na história de registros da CPT, desde 1985. Foram 2.185 conflitos, sendo 78% (1.680) ocorrências de violência por terra.
O relatório ainda expõe como o avanço do agro-hidro-minero-negócio, com o uso desenfreado de agrotóxicos e a devastação ambiental, violam o direito à vida e ao território, além da negligência e omissão do Estado, que intensifica a vulnerabilidade dos povos em meio aos conflitos. “Os dados da CPT reforçam que os números de violência no campo seguem altos, tendo o Estado como um dos principais violadores. Nesse sentido, a Declaração dos Direitos dos Camponeses e das Camponeses é mais um instrumento para a defesa da vida e modo de viver de todos os povos do campo, das águas e das florestas”, avalia Lara Estevão, advogada popular e representante da CPT no CNDH.
Seguindo a Recomendação do CNDH, o Estado brasileiro tem novamente a chance de atestar seu compromisso não só com os direitos de camponeses e camponesas, mas com a preservação da sociobiodiversidade e a mitigação da crise climática, uma vez que os povos e comunidades do campo, das águas e das florestas, com seus modos de vida em confluência com a natureza, são a resistência da vida nos territórios, onde o latifúndio se empenha na promoção a morte.
Acesse o Livro de Ilustrações da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Camponeses e Outras Pessoas que Trabalham em Áreas Rurais, produzido pela Via Campesina (ES)