Romaria dos Mártires da Floresta reafirma memória, esperança e luta pela Amazônia

Realizada de 06 a 08 de junho no Pará, a Romaria dos Mártires da Floresta relembra o legado de Zé Claudio e Maria na luta pela Amazônia. Foto: Francisco Alan / CPT
Realizada de 06 a 08 de junho no Pará, a Romaria dos Mártires da Floresta relembra o legado de Zé Claudio e Maria na luta pela Amazônia. Foto: Francisco Alan / CPT

Três dias de caminhada, memória e esperança: assim se pode resumir a 10a Romaria dos Mártires da Floresta, realizada de 06 a 08 de junho nos municípios de Nova Ipixuna e Marabá, no Pará. A Romaria relembra o legado do casal Zé Claudio e Maria do Espírito Santo, mas também dos demais mártires na luta pela Amazônia.

A 10ª Romaria dos Mártires da Floresta é uma organização do Instituto Zé Cláudio e Maria, com apoio da CPT Regional Pará, Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, Diocese de Marabá e movimentos sociais, em um momento de espiritualidade, peregrinação e reflexão reunindo cerca de 300 pessoas.

A programação iniciou na sexta-feira pela manhã, acompanhando a audiência que determinou o despejo das famílias que ocupam a Fazenda Mutamba, em Marabá, na qual foram vítimas de ataques de fazendeiros que reclamam a posse da terra. Em outubro de 2024, os ataques resultaram em dois trabalhadores rurais mortos e diversas pessoas feridas, e mesmo assim a justiça ainda corre o risco de não ser feita.

À tarde, uma mesa formada por representantes de movimentos sociais, universidade e organizações como a CPT Marabá, refletiu sobre os 10 anos da Romaria, um momento de grito por justiça, de honra àquelas e àqueles que tombaram e de renovação da fé na vida, nos povos e na Amazônia. A Mesa terminou com a exibição (seguida de debate) do documentário Toxic Amazon, de Felipe Milanez, que além de acompanhar as investigações sobre as mortes de Zé Cláudio e Maria, aborda as questões que envolvem a questão extrativista na região.

Além do casal Zé Claudio e Maria do Espírito Santo, também foram celebradas as vidas dos demais mártires na luta pela Amazônia. Foto: Caed Alves
Além do casal Zé Claudio e Maria do Espírito Santo, também foram celebradas as vidas dos demais mártires na luta pela Amazônia. Foto: Caed Alves

No sábado pela manhã, as romeiras e romeiros, que já estavam hospedados na Fundação Cabanagem, em Marabá, tomaram um café da manhã reforçado e seguiram viagem para Nova Ipixuna, onde participaram de uma Roda de Conversa no Sindicato de Trabalhadores/as Rurais, e à tarde seguiram em caminhada até a casa de Zé Cláudio e Maria. A chegada à majestade da castanheira testemunhou mais uma vez que a memória resiste, a ecologia vive, e a esperança floresce.

Aos pés da Majestade castanheira, também foi realizada a missa no domingo pela manhã, seguida do Tapiri dos Povos. Foto: Caed Alves
Aos pés da Majestade castanheira, também foi realizada a missa no domingo pela manhã, seguida do Tapiri dos Povos. Foto: Caed Alves

“A Diocese de Marabá acolhe com esperança a Romaria dos Mártires das Florestas. Anualmente participo e celebro com o povo de Deus que defende e cuida da Casa Comum. Nesse ano jubilar, quando realizamos o Jubileu dos defensores das florestas, a Romaria percorreu 5 km de peregrinação, uma profunda oração e reflexão para continuarmos lutando por justiça socioambiental”, destacou o bispo Dom Vital Corbellini, muito emocionado durante a Romaria.

Bispo Dom Vital Corbellini, da Diocese de Marabá, presença constante nas Romarias dos Mártires da Floresta. Foto: CNBB Norte 2
Bispo Dom Vital Corbellini, da Diocese de Marabá, presença constante nas Romarias dos Mártires da Floresta. Foto: CNBB Norte 2

Para Francisco Alan, da Coordenação Regional da CPT Pará, a romaria foi uma renovação da fé: “A Romaria foi um momento forte, regada de uma espiritualidade centrada na defesa da floresta, nossa Casa Comum. Vivenciar essa caminhada é renovar a fé e o nosso compromisso na construção do Reino de Deus. A memória do martírio de Zé Cláudio e Maria, bem como os demais mártires da Amazônia, nos motiva a continuar a luta na defesa da vida e das nossas florestas. Os 10 anos de romaria é festa, é celebração, é esperançar por uma sociedade mais justa”, afirmou Alan.

Histórico do conflito

Em 24 de maio de 2011, o casal de castanheiros extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo (Zé Cláudio e Maria) foram assassinados na cidade de Nova Ipixuna, no Sudeste do Pará. Zé Cláudio e Maria eram lideranças reconhecidas do Projeto Agroextrativista Praialta-Piranheira, e denunciavam invasões e roubo de madeira, e foram mortos por contrariar interesses de grileiros e madeireiros que queriam destruir a floresta. Clique aqui e conheça nossa sessão em memória aos mártires .

Determinada a manter o legado do irmão e da cunhada, Claudelice dos Santos assumiu as suas lutas com o intuito de manter vivo o sonho de exploração sustentável da floresta, de mobilização popular e de educação ecológica e inclusiva. Um dos frutos desta luta nasceu oficialmente: o Instituto Zé Cláudio e Maria, no qual Claudelice é coordenadora, que atua na defesa de lideranças amazônicas ameaçadas de morte e na educação de populações tradicionais do sudeste do Pará. Apesar da dor e da saudade, 10 anos após o crime, a luta dos ativistas segue forte e renovada através da “Romaria dos Mártires da Floresta”. Um evento anual organizado coletivamente por movimentos e organizações sociais que fazem questão de celebrar a vida e memória de Zé Claudio e Maria.

“Muita gente pergunta: ‘Por que romaria, se eles não eram santos?’. De fato eles não eram. E a nossa pretensão não é torná-los santos, mas sim levar para sempre a mensagem de fé, esperança e amor que eles tinham. Não deixar isso cair no esquecimento e honrar essa memória, essa visão de fé, esperança e amor pela natureza, pelo outro, pela humanidade”, explica a irmã de Zé Claudio.

“Não perder o esperançar! Era isso que Zé Claudio e Maria falavam. Não perder a fé de que teremos dias melhores, que conseguiremos manter nossas florestas, nossos rios. Que conseguiremos manter nossos povos com direitos e dignidade. Mas para isso, é preciso ter a ousadia de continuar lutando. Nós precisamos refletir sobre as formas de violência em que os povos são cometidos e ser ousados nas nossas lutas.”

Vocês dois, assim como todos nossos outros mártires, não morreram, vocês viraram sementes. “Aos nossos mártires nem um minuto de silêncio, mas toda uma vida de luta.”

Leia também:

03.06.2024CPT PARÁ PARTICIPA DA IX ROMARIA DOS MÁRTIRES DA FLORESTA, EM MEMÓRIA DE ZÉ CLÁUDIO E MARIA

Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações de Vivian Marler (Comunicação CNBB Norte 2)

Imagens: Caed Alves, Francisco Alan/CPT e Nathalia Alves

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