Pau D’Arco: memória, justiça, emoção e luta florescem onde o Estado tentou calar

Cerca de 300 pessoas participaram da exibição do documentário Pau D’Arco, promovida pelo projeto Cinefront, com apoio da comunidade local. Foto: Caed Alves (TramaTeia Produções)
Cerca de 300 pessoas participaram da exibição do documentário Pau D’Arco, promovida pelo projeto Cinefront, com apoio da comunidade local. Foto: Caed Alves (TramaTeia Produções)

Em um fim de semana carregado de emoção, memória e resistência, os moradores da comunidade da ocupação Jane Júlia (município de Pau D’Arco/PA), amigos, parceiros e convidados, reuniram-se nos dias 24 e 25 de maio para homenagear os dez trabalhadores assassinados no Massacre de Pau D’Arco, ocorrido em 2017. As atividades marcaram os oito anos do crime e reafirmaram a luta por justiça e pela efetivação da reforma agrária na região.

A celebração ecumênica realizada na tarde de sábado (24), com forte participação popular, trouxe à tona não apenas os nomes das vítimas da chacina — homenageados um a um com o grito coletivo de “Presente!” — como também a lembrança de Fernando Araújo e Rosenilton Pereira, ligados ao caso, e de José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, casal de extrativistas assassinados em 2011 por denunciarem crimes ambientais na região. A presença do bispo Dom Dominique You (Diocese de Santíssima Conceição do Araguaia) e do pastor Lindolfo, marcou o momento com palavras de esperança e justiça, o bispo ressaltou que a luz dos mártires deve continuar a iluminar os caminhos da comunidade.

Leitura de preces durante a celebração religiosa ecumênica. Foto: Arquivo CPT Xinguara
Leitura de preces durante a celebração religiosa ecumênica. Foto: Arquivo CPT Xinguara

Em um dos momentos mais comoventes do sábado, foi feita a leitura da Nota Pública da CPT – Comissão Pastoral da Terra, assinada por 19 entidades de direitos humanos, denunciando a impunidade que ainda marca o caso. O documento exige o julgamento imediato dos policiais envolvidos, reparação aos familiares e sobreviventes, a efetiva criação do assentamento Jane Júlia e o fim das ameaças aos acampamentos da reforma agrária no sul e sudeste do Pará. “O Estado que matou é o mesmo que silencia”, afirma a nota, destacando que nenhum dos acusados foi julgado ou punido até hoje.

A presença do bispo Dom Dominique You marcou o momento com palavras de esperança e justiça. O bispo ressaltou que a luz dos mártires deve continuar a iluminar os caminhos da comunidade. Foto: Acervo CPT Xinguara
A presença do bispo Dom Dominique You marcou o momento com palavras de esperança e justiça. O bispo ressaltou que a luz dos mártires deve continuar a iluminar os caminhos da comunidade. Foto: Acervo CPT Xinguara

Na mesma noite, cerca de 300 pessoas participaram da exibição do documentário Pau D’Arco, promovida pelo projeto Cinefront, com apoio da comunidade local. A sessão foi marcada por comoção intensa: muitos moradores da ocupação Jane Júlia se viram retratados na tela, revivendo a dor da perda e a coragem da resistência.

A exibição do documentário Pau D’Arco teve a presença especial de sua diretora, Ana Aranha, e do advogado popular José Vargas. Foto: Caed Alves (TramaTeia Produções)
A exibição do documentário Pau D’Arco teve a presença especial de sua diretora, Ana Aranha, e do advogado popular José Vargas. Foto: Caed Alves (TramaTeia Produções)

A exibição do documentário Pau D’Arco teve a presença especial de sua diretora, Ana Aranha, cuja escuta sensível e comprometida com a verdade foi reconhecida e acolhida pela comunidade com gratidão e emoção.

Uma figura de destaque no filme e na plateia foi o advogado José Vargas e sua família. Vargas se destaca como um defensor incansável dos direitos humanos na região, cuja trajetória de luta e apoio às famílias foi ovacionada pelos presentes. 

A história de Fernando Araújo, sobrevivente do massacre e principal testemunha do crime, foi o centro do documentário Pau D’Arco e tocou profundamente todos os presentes. Seu relato corajoso, entrelaçado com imagens fortes e depoimentos marcantes, fez ecoar no local não apenas a dor da violência vivida, mas também a firmeza de quem ousou denunciar e resistir. 

Pau D'Arco: caminhada da memória pelo mesmo caminho percorrido pelas vítimas no dia do massacre. Foto: Mariana Genesca
Pau D’Arco: caminhada da memória pelo mesmo caminho percorrido pelas vítimas no dia do massacre. Foto: Mariana Genesca

No domingo (25), o evento seguiu com o Café da Reforma Agrária e uma caminhada da memória pelo mesmo caminho percorrido pelas vítimas no dia do massacre. Durante o trajeto, paradas simbólicas com panos preto, vermelho e branco representaram o luto, a resistência e a luta digna dos trabalhadores rurais. O percurso terminou no memorial construído no local da chacina, onde ocorreu o plantio de mudas de árvores, cada uma simbolizando uma vítima.

Plantio de mudas de árvores, cada uma em memória de uma vítima do Massacre de Pau D'Arco e de violências que aconteceram posteriormente. Foto: Andreia Silvério
Plantio de mudas de árvores, cada uma em memória de uma vítima do Massacre de Pau D’Arco e de violências que aconteceram posteriormente. Foto: Andreia Silvério

Em um gesto de alcance simbólico e espiritual, também foi plantada uma muda em homenagem ao Papa Francisco, reconhecido por sua voz profética em defesa da terra, dos pobres e da casa comum. 

O ato foi encerrado com falas de lideranças locais, palavras de ordem e o compromisso coletivo com a justiça e a memória. “Massacre de Pau D’Arco, nunca mais!”, “Reforma Agrária, quando? Já!”.

Lideranças locais e a comunidade manifestaram palavras de ordem e o compromisso coletivo com a justiça e a memória. “Massacre de Pau D’Arco, nunca mais!”, “Reforma Agrária, quando? Já!”. Foto: Mariana Genesca
Lideranças locais e a comunidade manifestaram palavras de ordem e o compromisso coletivo com a justiça e a memória. “Massacre de Pau D’Arco, nunca mais!”, “Reforma Agrária, quando? Já!”. Foto: Mariana Genesca

A realização das atividades contou com o apoio, além das equipes da CPT de Xinguara e Marabá e da Associação Nova Vitória, de outras  organizações comprometidas com a memória e os direitos humanos, como o Cinefront, o Coletivo Veredas e o Instituto Zé Cláudio e Maria (IZM), que contribuíram ativamente para a mobilização, organização e registro dos momentos vividos. 

O fim de semana não foi apenas de memória. Foi um chamado coletivo à ação. O sangue derramado em Pau D’Arco segue clamando por justiça, e sua semente germina em luta, comunidade e vida.

Encerramento do 8º Ato em Memória às vítimas do Massacre de Pau D'Arco. Foto: Arquivo CPT Xinguara
Encerramento do 8º Ato em Memória às vítimas do Massacre de Pau D’Arco. Foto: Arquivo CPT Xinguara

(Texto: CPT Xinguara/PA)

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