Carta da sociedade civil pede transparência e participação no GT de Diálogo Federativo no Pará

Sociedade civil do Pará reivindica transparência e participação no Grupo de Trabalho sobre regularização fundiária de terras públicas federais, especialmente nas terras indígenas e territórios quilombolas. Foto: Divulgação MDA
Sociedade civil do Pará reivindica transparência e participação no Grupo de Trabalho sobre regularização fundiária de terras públicas federais, especialmente nas terras indígenas e territórios quilombolas. Foto: Divulgação MDA

Organizações da sociedade civil e movimentos populares do Estado do Pará publicaram uma Carta conjunta endereçada à Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais (CTD), órgão ligado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).

Através da Resolução nº 18, publicada no Diário Oficial da União na última sexta-feira (16), a Câmara Técnica criou um Grupo de Trabalho (GT) para analisar e debater questões voltadas à destinação de terras públicas estaduais e federais no campo paraense. O GT tem um prazo de 90 dias, podendo ser prorrogado por mais 90 dias, para reunir propostas para destinação destas terras.

O Grupo de Trabalho tem a parceria do governo do estado do Pará, e prevê a presença de dois representantes de cada órgão ou entidade que compõe a CTD (sendo um titular e um suplente). Representantes do Poder Legislativo, dos municípios e de organizações da sociedade civil podem ser convidados para participar das reuniões, mas não há uma garantia desta presença efetiva com voz e voto.

Através de levantamento da Câmara Técnica, um total de 13,1 milhões de hectares no estado podem se tornar unidades de conservação, terras indígenas, territórios quilombolas ou assentamentos. Para a Amazônia, a previsão é de destinação de cerca de 50 milhões de hectares em terras públicas.

Os membros da Câmara Técnica destacaram quatro regiões prioritárias para a destinação de terras públicas, representadas na figura abaixo: (1) sul do Estado do Amazonas; (2) área de influência da BR-319; (3) divisa entre os estados do Maranhão, Tocantins e Pará; e (4) área de influência da BR-163.

Distribuição das quatro regiões prioritárias, na Amazônia Legal, definidas no Plano de Ação da CTD: sul do Estado do Amazonas (verde); área de influência da BR-319 (vermelho); divisa entre os estados do Maranhão, Tocantins e Pará (laranja); e área de influência da BR-163 (roxo).
Distribuição das quatro regiões prioritárias, na Amazônia Legal, definidas no Plano de Ação da CTD: sul do Estado do Amazonas (verde); área de influência da BR-319 (vermelho); divisa entre os estados do Maranhão, Tocantins e Pará (laranja); e área de influência da BR-163 (roxo).

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Carta da Sociedade Civil por transparência e participação no GT de Diálogo Federativo

Estado do Pará, 16 de maio de 2025.

À Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais – CTD

C/C
Secretaria de Governança Fundiária, Desenvolvimento Territorial e Socioambiental
Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar – MDA

Assunto: Participação da sociedade civil no Grupo de Trabalho de Diálogo Federativo – Resolução nº 18/2025

As organizações da sociedade civil abaixo assinadas vêm, por meio desta, manifestar preocupação quanto à forma de constituição do Grupo de Trabalho de Diálogo Federativo, instituído pela Resolução nº 18, de 14 de maio de 2025, no âmbito da Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais – CTD, em parceria com o Governo do Estado do Pará.

Reconhecemos a importância da criação do GT como medida para destravar processos de regularização fundiária e garantir a destinação adequada das terras públicas no estado. No entanto, chamamos a atenção para a ausência de representantes da sociedade civil em sua composição formal, o que compromete a legitimidade, a efetividade e a transparência do processo.

A previsão de participação apenas como convidadas eventuais, conforme o art. 5º da Resolução, não assegura a presença estável e deliberativa de organizações que atuam há décadas nos territórios diretamente impactados pelos conflitos fundiários e ambientais no Pará. Tal ausência dificulta o acompanhamento técnico e social das medidas adotadas e afasta os segmentos que historicamente acumulam conhecimento prático e jurídico sobre os desafios da destinação fundiária.

Conforme os dados mais recentes do Caderno de Conflitos no Campo Brasil 2024, publicado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Pará segue liderando os indicadores de violência no campo, com um número expressivo de assassinatos, ameaças e conflitos territoriais envolvendo comunidades tradicionais, indígenas, quilombolas, posseiros e pequenos agricultores. Nesse cenário, a presença ativa da sociedade civil no GT não é apenas desejável, mas indispensável para que o grupo cumpra seu papel de mediação e formulação de soluções duradouras e legítimas.

Ressaltamos ainda que as discussões sobre a destinação de terras públicas devem estar obrigatoriamente pautadas pelos preceitos constitucionais: a função social daterra, a prioridade para a reforma agrária, a proteção das terras indígenas e quilombolas, a criação e consolidação de unidades de conservação, e a garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais. A sociedade civil organizada tem papel fundamental em zelar para que esses princípios sejam respeitados na prática, e sua presença nos espaços institucionais de decisão contribui para a efetividade dessas garantias.

Para além das medidas emergenciais, é urgente a adoção de políticas estruturantes que enfrentem as causas profundas dos conflitos fundiários no estado. Isso inclui a edição de um Decreto sobre Ordenamento Territorial, a garantia de participação efetiva da sociedade civil e dos movimentos sociais na Câmara Técnica Federal de Destinação de Terras Públicas, bem como a instalação e funcionamento imediato da Câmara Técnica Estadual de Destinação de Terras Públicas, criada desde 2020 e até hoje não implementada.

Diante disso, reivindicamos a inclusão formal e paritária de representantes da sociedade civil na composição do Grupo de Trabalho, com direito a voz e voto nas discussões e deliberações, a fim de garantir um processo democrático, transparente e sensível às realidades do campo e da floresta. Para tanto, requeremos a alteração da resolução para que haja previsão de composição do GT pela sociedade civil como membro efetivo.

Estamos à disposição para colaborar com critérios de representação, contribuir tecnicamente com os debates e fortalecer o papel do GT como espaço público de construção de políticas fundiárias com justiça social.

Atenciosamente,

  • Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAP
  • Comissão Pastoral da Terra | Comissão de Direitos Humanos da OAB, Subseção Xinguara
  • Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares – CONTAG
  • Conselho Regional de Serviço Social – 1ª Região
  • Coletivo Maparajuba Direitos Humanos na Amazônia
  • Coletivo Veredas
  • Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE
  • Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do Pará – FETAGRI
  • Instituto Zé Cláudio e Maria – IZM
  • Girolamo D. Treccani – OAB/PA 6172
  • Manoel Castilho – OAB/DF 1398
  • Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
  • Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
  • Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos – SDDH
  • Terra de Direitos

A Carta Completa também pode ser baixada neste link.

Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional)

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