Mesmo com sentença favorável da Justiça, famílias posseiras do Amapá aguardam a garantia da permanência na terra
Por Carlos Henrique Silva (Comunicação CPT Nacional),
com informações da CPT Regional Amapá

Depois de uma vitória parcial no mês de fevereiro, duas famílias posseiras do Amapá, acompanhadas pela CPT na região da antiga Fazenda Sucuriju, na zona rural do município de Ferreira Gomes, ainda aguardam uma posição definitiva da Justiça contra a multinacional Amcel Agroflorestal, empresa produtora de eucalipto para a indústria de celulose, papel e produtos de madeira.
Em 2019, as famílias de seu Alberto Ramos e de dona Ana Célia Ferreira foram notificadas com uma liminar para reintegração de posse em favor da empresa. A Amcel alegava que estas pessoas seriam apenas laranjas de pessoas de maior posse, para conseguir segurar essa terra para depois vender.
Após uma manifestação da CPT, com provas de que a área titulada da empresa não abrangia a área questionada por ela, a liminar foi recolhida e se iniciou uma longa disputa judicial que durou 6 anos. Em junho de 2024, foi marcada uma vistoria na área em questão, na qual o perito do juiz pôde constatar a veracidade das nossas alegações. Após audiência final e alegações finais, veio finalmente em 20 de fevereiro deste ano a tão sonhada sentença, com a vitória das famílias tradicionais.

Uma sentença ainda parcial, pois a empresa ainda pode recorrer. Até agora a sentença permanece, mas a empresa já entrou com embargos de declaração, que ainda não foram julgados.
“A Pastoral da Terra apresentou um relatório demonstrando que essa propriedade nunca pertenceu a esta empresa, e sim às famílias, desde seus pais e avós. As casas e as roças são indícios da atividade econômica, além das testemunhas que são moradoras da região e que conhecem as famílias que há muitos anos sobrevivem da área”, afirma o advogado das famílias, Dr. Max Edson Monteiro.
O agricultor Eraldo dos Santos, vizinho dos posseiros, conhece as famílias desde criança: “A gente se criou um perto do outro, crescendo e estudando na mesma escola, e depois cada qual foi casando e constituindo sua família. A empresa sempre ameaçou os posseiros, e até que o conflito está na Justiça. Os agricultores que moram no local, os pais deles foram donos dessas terras ha muitos anos, morreram trabalhando lá, casaram e continuam vivendo na região. É mais do que direito deles, ganharem essa causa”, afirma Eraldo.
Histórico do conflito
O conflito com a Amcel começou ainda em 1995, quando a empresa “adquiriu” essas áreas de outros especuladores. A situação teve uma parada no início de 2000 e voltou com mais força a partir de 2007, quando o pacote acionário da multinacional passou do capital americano para o capital japonês, com a Marubeni Corporation.
Vivendo na localidade há mais de 40 anos, as famílias de dona Ana Célia e de seu Alberto trabalham na terra na plantação de mandioca, abacaxi, batata e criação de porcos, desde seus antepassados, e por isso é possível encontrar casas antigas e roças consolidadas. Com o avanço dos empreendimentos da Amcel a partir de 2009, os limites que chegavam até o Rio Sucuriju foram ampliados ilegalmente até o Rio Chiquinho, sobrepondo as áreas dos posseiros. Esta sobreposição do georreferenciamento foi um dos pontos considerados na decisão judicial.

“Foram muitas perseguições por parte de funcionários da Amcel a essas famílias de pequenos agricultores, ao longo destes anos, como ameaças de derrubar casas, ameaças judiciais, ameaças através de policiais levados para a localidade”, afirma o Pe. Sisto Magro, da coordenação da CPT Regional Amapá.
Para ele, esta vitória significa que sempre há esperança de mostrar as incongruências da empresa Amcel e de outras empresas estrangeiras e nacionais, sobretudo quando entidades públicas como o Ministério Público e a Defensoria Pública atuam do lado das comunidades tradicionais e das famílias posseiras do Amapá.

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